Page 23 - ARTE!Brasileiros #56
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O instituto nunca deixou, no entanto, de depender também dos aportes de
Bernardo Paz para fechar as contas - que variam entre R$ 36 e R$ 39 milhões ao
ano. Afastado da presidência desde 2017, Paz segue presente no dia a dia do museu.
Nesse sentido, Grassi conta dos esforços atuais para aumentar a captação, não só
através de empresas brasileiras e do círculo de patronos, mas também de fundos
internacionais que apoiam a cultura e o meio ambiente. Categorizado como orga-
nização da sociedade civil de interesse público (oscip), Inhotim foi reconhecido
em 2010 também como Jardim Botânico, além de museu, e reúne mais de 4,3 mil
espécies nativas brasileiras e exóticas. Segundo Grassi, se os custos totais para a
manutenção forem cobertos por patrocínios e apoios, os recursos vindos de Ber-
nardo Paz podem se voltar apenas para novos projetos no instituto.
Grassi tem a percepção clara, no entanto, de que o quadro atual do país não é
dos mais favoráveis para quem trabalha com cultura, meio ambiente e educação
- o setor educativo do museu envolve amplo programa de formação e escola de
música. “Mesmo que a situação política atual não tenha nos afetado diretamente,
no sentido de termos um plano aprovado, com apoiadores e patrocinadores bem
consolidada, é inevitável constatar que estamos em um cenário onde instituições
artísticas e culturais, a arte e a cultura em geral, tem patinado para sobreviver. E
embora isso já viesse sendo anunciado desde a campanha eleitoral - com o papo
dos ‘mamadores da Lei Rouanet’ -, pensava-se que o exercício do poder traria algu-
ma adequação um pouco mais diplomática. E, tragicamente, nós não tivemos isso,
vemos um acirramento cada vez pior. Isso é muito grave.” Quanto ao ambiente de
censura às artes que volta a surgir no país, Grassi completa: “Nunca tivemos algum
caso específico em Inhotim, mas viver em um contexto em que sabemos que isso
existe já nos contamina, nos atinge”.
novas obras
Da relação de Inhotim com Brumadinho surge a obra comissionada de Lucia Koch,
que ocupa tanto áreas do museu quanto outdoors nas ruas da cidade. Koch afirma, na
verdade, que Propaganda surge na cidade e desemboca no instituto, não o contrário.
Convidada para pensar uma trabalho em 2019, a artista gaúcha, radicada em São
Paulo, encontrou uma situação atípica na região após o rompimento da barragem
do Córrego do Feijão: “A cidade, inteira de luto, revirada de lama e minério, começa
a receber indenizações enormes [da Vale], situação que leva a uma explosão no
mercado de carros importados e condomínios de luxo. Isso se revela nas imagens
espalhadas pela cidade, na quantidade de outdoors por lá”. Intrigada com aquela
situação paradoxal, Koch deu sequência a uma pesquisa de quase três décadas na
qual fotografa interiores de embalagens vazias e as imprime em grandes dimensões.
Dessa vez, as embalagens escolhidas foram um saco de carvão Arco-Íris - marca
comum nos mercados de Brumadinho -, uma queijeira utilizada na região e uma caixa
de papelão. Sem deixar totalmente nítido o que registram as fotos, que acabam lem-
brando um tipo de caverna ou alguma estrutura arquitetônica, as imagens passaram
a ocupar outdoors da cidade. “A ideia de que esses painéis não terão, por um ano,
publicidade de carros, condomínios, venda de seguros ou de cursos de informática
e, ao mesmo tempo, estarão substituídos por imagens que não se entende muito
FOTOS CORTESIA INHOTIM lugar”, conta a artista. Além disso, ela conclui: “Embalagens vazias tem a ver com
o que fazem ali… esse tipo de perturbação é o que me interessava colocar naquele
o depois das coisas, que é algo com que nós e Brumadinho temos que lidar”.
É também da relação com o lugar, físico e cultural, que foi pensado o trabalho site
specific de Rommulo Vieira Conceição, intitulado O espaço físico pode ser um lugar
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