Page 23 - ARTE!Brasileiros #53
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também foram infinitamente menores. “Nas feiras, o  “A pessoa que fazia comunicação digital passou a ser a
            preço do estande, as viagens, hospedagens, o transporte   pessoa com mais importância na galeria”, brinca Thiago
            de obras e os seguros, tudo é um orçamento muito alto.  Gomide. Para Alexandre Gabriel, “qualquer projeto que
            E mesmo as exposições virtuais da galeria foram mais   a gente vá fazer a partir de agora, eu vou pensar em qual
            baratas de fazer. O que aconteceu, no final do ano, é   é a imagem dele online, como ele acontece também
            que a gente conseguiu manter o faturamento, mas a   virtualmente. E isso não tem volta”.
            despesa caiu”, afirma Roesler.                     É nesse sentido que Tamara Perlman percebe uma
               De modo quase forçado, a chegada da pandemia   mudança importante, que já se fazia necessária há
            obrigou uma revisão de modelos e métodos de trabalho   tempos. “Muito rapidamente as galerias se juntaram
            que, segundo os próprios galeristas e organizadores   de uma forma ou outra, mudaram modelos de negócio,
            de feiras, já começavam a dar sinais de esgotamento.  adotaram tecnologias e testaram coisas. E isso foi muito
            O excesso de deslocamentos pelo mundo, em uma    interessante porque elas se deram o direito de experi-
            agenda incessante ao longo do ano, certamente será   mentar, o que era uma coisa muito difícil - até por uma
            revisto, mesmo em um futuro pós-pandêmico. “Acho   razão compreensível, já que elas vivem de reputação.
            que as feiras vão ficar cada vez mais locais, e o que vai   Então na construção de uma marca, as casas têm muito
            conectar o evento com o mundo é o online. Uma feira   receio de errar. E a pandemia, principalmente o começo,
            em Londres vai receber principalmente o pessoal de   foi um momento em que isso mudou: pode testar; pode
            Londres, e o virtual servirá para as pessoas de fora”,  experimentar; tudo bem uma galeria grande estar ao
            supõe Finkelstein. Para feiras em países de fora do   lado de uma pequena.” A Fortes D’Aloia e Gabriel, por
            eixo central do mercado, como o Brasil, isso pode ser  exemplo, participou da Art Basel Miami Beach apenas
            proveitoso, segundo Feitosa. “Estamos a pelo menos   com filmes de artista, o que seria impensável em outro
            dez horas de distância dos eua, da Europa e ainda mais   contexto, e aproveitou para lançar a plataforma fdag,
            do Japão, por exemplo. Então o fluxo de visitantes inter- voltada apenas para obras audiovisuais.
            nacionais para uma feira aqui é menor do que em outros
            países. Com o online, este ano eu tive na sp-Arte 15%  o insubstituÍvel
            de visitação estrangeira, enquanto na feira presencial   Apesar do balanço positivo, do avanço virtual e da entrada
            este número era em média de 2%.”                 de novos colecionadores no mercado, os galeristas admi-
               O formato híbrido, em que o evento acontece em   tem certo esgotamento com a situação. “Vou te dizer que
            escala reduzida no presencial e é complementado   estou começando a me sentir com o hd riscado”, comenta
            pela plataforma virtual, foi experimentado pela ArtRio,  Gabriel. “Foi muito trabalho, uma coisa insana.” Murilo
            realizada em um período em que a primeira onda da   Castro, que promoveu 50 lives durante a pandemia, vai
            pandemia parecia estar diminuindo e a segunda não   na mesma direção: “Eu diria que nunca trabalhei tanto
            havia chegado. O resultado foi elogiado pelos galeristas   quanto neste ano. E sinto falta das relações, porque a
            entrevistados, que confirmaram a realização de um   nossa área vive de contato pessoal, de confiabilidade.
            alto número de transações. “Acredito que esse modelo   Então não acho que o online pode substituir isso, mas
            híbrido é o que vai funcionar tanto para feiras quanto   sim incrementar informações e possibilidade”.
            para galerias. Vão sobreviver as que conseguirem   Alexandre Roesler, mesmo vislumbrando menos via-
            operar tanto online quanto no offline com a mesma   gens - “já vimos que é possível resolver muita coisa em
            força”, diz Bailune. Quanto aos leilões, Aloísio Cravo   uma videoconferência” - ressalta também que mesmo
            completa: “Daqui para a frente, para fazer um leilão   a experiência em uma feira, por vezes cansativa, tem
            presencial tem que ser com uma coleção excepcional,  vários benefícios insubstituíveis: “Você faz uma viagem
            uma solenidade. Porque sinto que esse modelo online   e vai a museus, exposições, encontra pessoas que só
            deu muito certo”.                                vê nesse circuito, conhece novos artistas”. O que se
               É notável, neste sentido, a grande movimentação e   espera, portanto, é que em um mundo pós-pandêmico
            o esforço das casas brasileiras para se manter ativas   os avanços digitais, somados à inserção de novos e
            e presentes nas plataformas virtuais ao longo do ano.  jovens compradores, se somem a uma retomada de
            Exposições se tornaram Viewing Rooms; lives com   atividades presenciais. “Eu diria que em termos de
            galeristas, curadores e artistas pipocaram nas redes   mercado nós teremos um ganho no futuro”, conclui
            sociais; novas plataformas surgiram e a produção de   Castro. Mas não se pode negar: “Culturalmente, sim,
            conteúdos em vídeo, áudio e imagens foi intensificada.  este foi um ano muito ruim”.

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