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também foram infinitamente menores. “Nas feiras, o “A pessoa que fazia comunicação digital passou a ser a
preço do estande, as viagens, hospedagens, o transporte pessoa com mais importância na galeria”, brinca Thiago
de obras e os seguros, tudo é um orçamento muito alto. Gomide. Para Alexandre Gabriel, “qualquer projeto que
E mesmo as exposições virtuais da galeria foram mais a gente vá fazer a partir de agora, eu vou pensar em qual
baratas de fazer. O que aconteceu, no final do ano, é é a imagem dele online, como ele acontece também
que a gente conseguiu manter o faturamento, mas a virtualmente. E isso não tem volta”.
despesa caiu”, afirma Roesler. É nesse sentido que Tamara Perlman percebe uma
De modo quase forçado, a chegada da pandemia mudança importante, que já se fazia necessária há
obrigou uma revisão de modelos e métodos de trabalho tempos. “Muito rapidamente as galerias se juntaram
que, segundo os próprios galeristas e organizadores de uma forma ou outra, mudaram modelos de negócio,
de feiras, já começavam a dar sinais de esgotamento. adotaram tecnologias e testaram coisas. E isso foi muito
O excesso de deslocamentos pelo mundo, em uma interessante porque elas se deram o direito de experi-
agenda incessante ao longo do ano, certamente será mentar, o que era uma coisa muito difícil - até por uma
revisto, mesmo em um futuro pós-pandêmico. “Acho razão compreensível, já que elas vivem de reputação.
que as feiras vão ficar cada vez mais locais, e o que vai Então na construção de uma marca, as casas têm muito
conectar o evento com o mundo é o online. Uma feira receio de errar. E a pandemia, principalmente o começo,
em Londres vai receber principalmente o pessoal de foi um momento em que isso mudou: pode testar; pode
Londres, e o virtual servirá para as pessoas de fora”, experimentar; tudo bem uma galeria grande estar ao
supõe Finkelstein. Para feiras em países de fora do lado de uma pequena.” A Fortes D’Aloia e Gabriel, por
eixo central do mercado, como o Brasil, isso pode ser exemplo, participou da Art Basel Miami Beach apenas
proveitoso, segundo Feitosa. “Estamos a pelo menos com filmes de artista, o que seria impensável em outro
dez horas de distância dos eua, da Europa e ainda mais contexto, e aproveitou para lançar a plataforma fdag,
do Japão, por exemplo. Então o fluxo de visitantes inter- voltada apenas para obras audiovisuais.
nacionais para uma feira aqui é menor do que em outros
países. Com o online, este ano eu tive na sp-Arte 15% o insubstituÍvel
de visitação estrangeira, enquanto na feira presencial Apesar do balanço positivo, do avanço virtual e da entrada
este número era em média de 2%.” de novos colecionadores no mercado, os galeristas admi-
O formato híbrido, em que o evento acontece em tem certo esgotamento com a situação. “Vou te dizer que
escala reduzida no presencial e é complementado estou começando a me sentir com o hd riscado”, comenta
pela plataforma virtual, foi experimentado pela ArtRio, Gabriel. “Foi muito trabalho, uma coisa insana.” Murilo
realizada em um período em que a primeira onda da Castro, que promoveu 50 lives durante a pandemia, vai
pandemia parecia estar diminuindo e a segunda não na mesma direção: “Eu diria que nunca trabalhei tanto
havia chegado. O resultado foi elogiado pelos galeristas quanto neste ano. E sinto falta das relações, porque a
entrevistados, que confirmaram a realização de um nossa área vive de contato pessoal, de confiabilidade.
alto número de transações. “Acredito que esse modelo Então não acho que o online pode substituir isso, mas
híbrido é o que vai funcionar tanto para feiras quanto sim incrementar informações e possibilidade”.
para galerias. Vão sobreviver as que conseguirem Alexandre Roesler, mesmo vislumbrando menos via-
operar tanto online quanto no offline com a mesma gens - “já vimos que é possível resolver muita coisa em
força”, diz Bailune. Quanto aos leilões, Aloísio Cravo uma videoconferência” - ressalta também que mesmo
completa: “Daqui para a frente, para fazer um leilão a experiência em uma feira, por vezes cansativa, tem
presencial tem que ser com uma coleção excepcional, vários benefícios insubstituíveis: “Você faz uma viagem
uma solenidade. Porque sinto que esse modelo online e vai a museus, exposições, encontra pessoas que só
deu muito certo”. vê nesse circuito, conhece novos artistas”. O que se
É notável, neste sentido, a grande movimentação e espera, portanto, é que em um mundo pós-pandêmico
o esforço das casas brasileiras para se manter ativas os avanços digitais, somados à inserção de novos e
e presentes nas plataformas virtuais ao longo do ano. jovens compradores, se somem a uma retomada de
Exposições se tornaram Viewing Rooms; lives com atividades presenciais. “Eu diria que em termos de
galeristas, curadores e artistas pipocaram nas redes mercado nós teremos um ganho no futuro”, conclui
sociais; novas plataformas surgiram e a produção de Castro. Mas não se pode negar: “Culturalmente, sim,
conteúdos em vídeo, áudio e imagens foi intensificada. este foi um ano muito ruim”.
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