Teatro de Contâiner
Teatro de Contâiner. Divulgação

Após uma violenta invasão na tarde desta terça-feira, 19, pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), polícia subordinada à Prefeitura de São Paulo, artistas, produtores, técnicos, encenadores e frequentadores do Teatro de Contêiner Mungunzá estão promovendo neste momento uma ocupação pacífica e permanente do complexo cultural e social independente (localizado no centro da cidade de São Paulo, na região da Luz). Os ocupantes querem impedir a demolição do complexo, considerado um dos mais notáveis esforços de recuperação de uma área urbana degradada (foram mais de 4 mil atividades artístico-sociais realizadas nos últimos 9 anos).

A ação policial foi truculenta. Segundo Lucas Beda, co-criador do coletivo do Contêiner, o enfrentamento se deu porque a prefeitura queria montar uma estrutura para receber o prefeito, Ricardo Nunes, e o governador, Tarcísio de Freitas, em uma cerimônia. Essa montagem poderia comprometer a integridade do teatro, o que colocaria em risco os frequentadores e equipes de serviço. Alegando ordem judicial, a polícia manteve equipes e membros da ONG Tem Sentimento (baseada no local) sitiados no prédio, impedindo o acesso aos objetos pessoais dos trabalhadores da cultura, e depois fazendo uso até de spray de pimenta e força física.

Os gestores do teatro rebatiam, mostrando que há um inquérito em curso no Ministério Público que visa responsabilizar autoridades e impedir a ação, que pode ser irreversível se levada a cabo. E nesta quinta-feira, 21, acaba o prazo judicial para que os artistas desocupem o espaço. “Vocês não têm vergonha de se prestar a esse papel?”, afirmou uma atriz que a GCM tentava retirar do espaço. A prefeitura ambiciona desapropriar a área com a justificativa de querer implantar ali um programa habitacional.

A ação da Prefeitura de São Paulo é a segunda movimentação arbitrária e truculenta contra espaços de artes cênicas da capital paulista. Em fevereiro, a administração municipal mandou demolir, de forma acintosa (com tratores invadindo o espaço) e ao arrepio da legislação de patrimônio, o tradicional Teatro Vento Forte e a escola de capoeira Angola Cruzeiro do Sul, no Parque do Povo, no Itaim Bibi. O ato violento desta terça-feira ocorreu justamente quando os artistas celebravam o Dia do Artista de Teatro.

Após a demolição do Vento Forte, o secretário de Cultura do prefeito Ricardo Nunes, Totó Parente, chegou a se comprometer publicamente com a reconstrução do complexo do Parque do Povo. Até hoje, entretanto, nada avançou. Os gestores do Teatro do Contêiner desconfiam do mesmo intento em relação à ação desta terça – primeiro, tornar irreversível a intervenção e, segundo, criar um falso espaço de diálogo com a classe artística. A maior preocupação que a prefeitura demonstra tem sido em atuar para satisfazer empreendimentos imobiliários privados e seus planos de investimentos nas áreas de usufruto coletivo e de promoção da cidadania. Não há registro, mesmo no auge da ditadura militar, de uma administração pública que tivesse investido com tal sanha destruidora contra espaços culturais.

“O Teatro de Contêiner precisa ser replicado como política pública, e não aniquilado”, protestou o ator Mateus Solano. “A prefeitura de SP quer ‘revitalizar’ expulsando cultura! O despejo do Teatro de Contêiner Mungunzá é mais um ataque ao povo: em vez de somar moradia + cultura, escolhem o autoritarismo. A prefeitura prova que não sabe governar para gente, só para concreto”, afirmou o vereador Jilmar Tatto, da oposição a Ricardo Nunes.

O Ministério da Cultura e a Funarte, organismos do governo federal, emitiram nota de repúdio à ação policial empreendida pela prefeitura de São Paulo. “Em ofício, até agora sem resposta, enviado ao prefeito Ricardo Nunes pela ministra da Cultura Margareth Menezes e pela presidenta da Funarte Maria Marighella, foi solicitada a ampliação do prazo dado pela Prefeitura para o despejo do coletivo artístico de sua sede, de modo a permitir que os entendimentos iniciados junto à Superintendência do Patrimônio da União para a busca de um novo terreno pudessem resultar positivamente”, diz a nota. “Lamentamos que o uso da força tenha substituído a continuidade do diálogo em prol da arte e da cultura, que cumprem papel relevante junto à comunidade do centro da capital paulista por meio da atuação do Teatro de Contêiner, da Cia Mungunzá e da ONG Tem Sentimento. Reforçamos nosso apelo para que o prazo seja ampliado e a negociação pacífica retomada com a maior brevidade possível”.


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