Há cerca de um ano, ao receber o convite de seu colega professor Telmo Porto para montar uma exposição em sua galeria, a Arte132, em São Paulo, com um recorte de sua coleção, Miguel Chaia partiu de duas condições: como esculturas do próprio acervo da galeria ocupam lugares de destaque no lugar, Chaia decidiu que a tridimensionalidade seria um dos vetores para a seleção, para que houvesse um diálogo, como um site specific; e, visto que o calendário de mostras dos últimos dois anos vinha sendo dominado por questões de raça, gênero, sexualidade e classe, ensejadas pelas efemérides da Semana de 22 e o Bicentenário da Independência, o colecionador preferiu se debruçar sobre a linguagem artística. Era então concebido o escopo de Tridimensional: Entre o sagrado e o estético, a primeira exposição exclusiva de sua coleção, segundo ele, que fica em cartaz até 11 de março, com co-curadoria de Laura Rago e Gustavo Herz.
O que Chaia não esperava, no entanto, era que os recentes acontecimentos em Brasília – dos ataques incendiários na cidade durante a diplomação do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e de seu vice, Geraldo Alckmin, e o posterior atentado terrorista aos palácios na Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro – iriam encontrar ecos nos trabalhos da nova mostra. A política se manifestava ali, meses após fechada a seleção de 45 peças, de um universo de quase 250 criações tridimensionais.
Segundo Chaia, que é também membro de conselhos do Itaú Cultural, do Instituto de Arte Contemporânea (IAC) e da Bienal de São Paulo, a polissemia que ele explorava no recorte inicial – um contraponto entre o sagrado e o estético na arte contemporânea – passou a revelar também um sentido político, ainda que a posteriori e de modo não intencional. Coordenador e pesquisador do Neamp (Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política) da PUC-SP, ele acabara não escapando do tema, abordado em suas aulas na Faculdade de Ciências Sociais da universidade paulistana, e caro, tanto às suas investigações acadêmicas como à própria coleção, desenvolvida há 45 anos ao lado de sua mulher, Vera.
“Há uma politização intensa da arte. A gente até perde um pouco o tesão para usufruir e curtir. Mas existe um imbricamento muito grande entre ambos. Como sou muito fascinado pelo assunto, resolvi fugir um pouco disso. Queria procurar um espaço de reflexão estética e sobre linguagem, mas não teve como evitar. A exposição reflete sobre o sagrado e deságua na política”, afirma Chaia à arte!brasileiros.
Para exemplificar, o colecionador lembra uma discussão que teria sido suscitada pelo artista norte-americano Donald Judd (1928-1994), segundo a qual a arte contemporânea “está entre a pintura e a escultura e que, nesse sentido, não sendo uma coisa nem outra, o objeto cria uma dimensão muito intensa de simbolismo”, diz Chaia. “E nós temos na exposição um trabalho do Nino Cais, que são duas marretas pesadíssimas na parede e, entre elas, há dois cálices, num equilíbrio muito precário. É uma obra que remete à força do poder, da violência, da opressão”.
Chaia cita outros exemplos, como o taco de beisebol de Rompedor de limites, de Marcelo Cidade; a obra Encalço, de André Komatsu, em que estilhaços de vidro aparecem emoldurados por uma estrutura de madeira e madeirite; e uma obra sem título, de Deyson Gilbert, em que quatro telas brancas estão pressionadas por sargentos, instrumentos da marcenaria usados para comprimir madeira.
“Se você olha a exposição após o 8 de janeiro, você vê os vidros quebrados em Brasília. Vê as marretas quebrando vidraças. O taco vandalizando as casas institucionais da Democracia”, argumenta Chaia. “No caso da obra de Deyson, é a própria pressão sobre a arte, o vandalismo contra a arte em Brasília. É a destruição do Di Cavalcanti, de todas obras que foram afetadas durante os ataques”.
A discussão inicialmente proposta, no entanto, permanece lá, predominante e avistada nas obras, de modo sutil e sensível pelo trio de curadores. Em texto crítico de Chaia, presente no catálogo, o trio de curadores estabelece os três pilares conceituais que guiaram seu recorte: “Será possível perceber na arte contemporânea vestígios do sagrado? O que pode haver de comum entre a arte e o sagrado? E, ainda, a arte contemporânea, ao ganhar autonomia, fortalecendo seu significado estritamente estético, abandona o mítico, a religião e a religiosidade na busca da revolução da linguagem?”, indagam.
Chaia conta que ele, ao lado de Laura e Gustavo, procuraram as respostas possíveis nos objetos, e algumas obras foram chave. “Inicialmente, chegamos a uma meia dúzia que consideramos referenciais. Uma delas é Copo de água benta ao lado de copo de água comum, de Deyson Gilbert. Quando você vê esse trabalho, nada permite saber o que é bento, sagrado, e o que não é. Somente quem montou sabe”, explica. “Outro trabalho importante foi um objeto manipulável da Karin Lambrecht, Uma porta para o perdão, feito com tecidos, em que você coloca um bilhetinho, com papéis que estão dispostos ao lado, pedindo perdão a quem você magoou”. A obra, ressalta ele, alude à relação com o outro, “que é o religar da religião”, em sua etimologia.
O colecionador destaca ainda que o trio conseguiu descobrir o sagrado nos trabalhos de Laura Vinci e de Felipe Cohen, por causa do mármore que usam, “um material que, na arte, veio da Grécia Antiga, passa pelo Renascimento, pelo estatuário. Como diz o Cohen, o mármore forjou deusas e deuses”, conta.
Já o trabalho Lola, de Lucia Koch, traz materiais transparentes, que lembram vitrais de uma catedral, sugere Chaia. “Temos ainda um trabalho da Valeska Soares, uma cápsula de vidro que parece um grande bebedouro de passarinho, e ele é preenchido por vinho e veneno. A água, o sangue, o vinho são uma triangulação de elementos que estão presentes em todos os rituais, do candomblé ao catolicismo. O fogo, por sua vez, é outra questão importante, com sua ideia do inferno, e que está no trabalho Cabeças cortadas, de Nicolás Robbio.
Há também duas obras de Tunga que o colecionador considera relevantes no escopo de sua curadoria: o Tacape, feito nos anos 1980, com imãs, que suscitam a discussão da energia que emana daquele material. E ainda os Vasos comunicantes, “uma ideia de vasilhame, que remete a taças de vinho gregas, ou que pode ser o Santo Graal, envolvidos por um tecido marrom, que é meio um Santo Sudário”, sugere.
Chaia também encontrou repercussões de seu recorte curatorial em dois trabalhos de José Resende: uma sem título, que é uma cruz de ferro invertida, e um tronco de madeira atravessado por ferros, numa alusão às flechas que atingem o corpo do santo em suas representações, sejam pinturas ou esculturas. “O interessante é o que o próprio Resende, com quem falei, afirma não ter pensado nessas questões ao conceber as obras. Os títulos vieram depois, independentes da vontade do artista”, conta Chaia. “Mas os objetos carregam essa potência narrativa”.
SERVIÇO
Tridimensionalidade – Entre o sagrado e o estético
Curadoria de Miguel Chaia, Laura Rago e Gustavo Herz
Até 11 de março
Arte132 Galeria – Av. Juriti, 132, Moema, São Paulo – SP
Visitação: segunda a sexta-feira, das 14h às 19h; sábados, das 11h às 17h
Entrada gratuita
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A exposição “Pinacoteca: Acervo” é feita do acervo de arte brasileira da Pinacoteca, ocupa 19 salas do Edifício Pinacoteca Luz com cerca de mil obras de mais de 400 artistas. Aberta
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A exposição “Pinacoteca: Acervo” é feita do acervo de arte brasileira da Pinacoteca, ocupa 19 salas do Edifício Pinacoteca Luz com cerca de mil obras de mais de 400 artistas.
Aberta ao público em 2020, substituiu a mostra de longa duração anterior, “Arte no Brasil: uma história da Pinacoteca de São Paulo”, que ficou em cartaz entre 2011 e 2019.
O PROJETO CURATORIAL
O acervo mescla tempos históricos e técnicas artísticas, debate a representatividade de artistas mulheres, afrodescendentes e indígenas no acervo, investiga as relações entre arte e sociedade, bem como a representação da paisagem e do espaço urbano. Assim, a mostra abandona as recorrentes narrativas lineares e cronológicas, em favor de novas perspectivas sobre a arte.
A exposição reúne itens de todas as coleções que hoje se encontram sob a tutela da Pinacoteca, incluindo os comodatos Nemirovsky e Roger Wright, mais alguns comodatos propostos especialmente para a mostra, como é o caso da obra da Adriana Varejão.
A narrativa expositiva está organizada em três núcleos, cujo fio condutor é a figura do artista. O primeiro, Territórios da Arte, aborda como artistas representam a si mesmos e aos outros, explorando, em seguida, as diferenças entre técnicas artísticas e entre as próprias definições de arte.
No segundo, Corpo e território, as abordagens se modificam e se centram na relação dos artistas com o mundo físico ao seu redor, as visões da paisagem e do ambiente urbano.
O último núcleo, Corpo individual / corpo coletivo, investiga as relações entre o artista e a coletividade, como questões de gênero e identidade.
NOVAS OBRAS NO ACERVO
Por meio de uma Doação do Programa de Patronos de Arte Contemporânea da Pinacoteca de São Paulo, o museu adquiriu, pela primeira vez, em 2019, obras de dois artistas indígenas contemporâneos: “Feitiço para salvar a Raposa Serra do Sol”, de Jaider Esbell, do povo Makuxi de Roraima, e “Voyeurs, Menu, Luto, Vitrine”; “O antropólogo moderno já nasceu antigo”; e “Enfim, Civilização”, de Denilson Baniwa, artista do povo Baniwa do Amazonas, que estão presentes na mostra.
Em 31 de outubro de 2020, a Pinacoteca de São Paulo inaugurou a exposição de longa duração de seu acervo ao mesmo tempo em que abriu a primeira exposição dedicada à arte dos povos originários, “Vexoá: Nós Sabemos”, que ocupou três salas para exposições temporárias localizadas no segundo andar do Edifício Pina Luz e teve a curadoria de Naine Terena.
O PROCESSO DE CONCEPÇÃO DE PINACOTECA: ACERVO
O Núcleo de Pesquisa e Curadoria deu início ao projeto da nova coleção da Pinacoteca de São Paulo, em 2017. A reformulação da exposição de longa duração foi elaborada pelo Núcleo de Pesquisa e Curadoria em conjunto com as outras áreas do museu.
Além de pesquisa de opinião realizada com visitantes do museu, um seminário realizado em 2018, “Modos de ver, modos de exibir”, trouxe muitos subsídios de reflexão para a equipe curatorial, especialmente no que diz respeito aos debates sobre o pós-colonialismo e a representatividade étnica e de gênero.
O projeto contou também com a interlocução com outros profissionais externos à Pinacoteca, como Moacir dos Anjos, Julia Rebouças, Renata Bittencourt e Denilson Baniwa.
Serviço
Exposição | Pinacoteca: Acervo
De 31 de outubro a 31 de dezembro 2028
Quarta a segunda, das 10h às 18h, quintas estendidas das 10h às 20h
Período
7 de setembro de 2024 10:00 - 18:00(GMT-03:00)
Local
Pina Luz
Praça da Luz, 2, Bom Retiro, São Paulo — SP
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Depois de atrair quase 1 milhão de visitantes com a exposição “Dos Brasis – arte e pensamento negro” – considerada uma das maiores mostras dedicadas exclusivamente à produção negra nacional -, o Centro Cultural Sesc Quitandinha, em Petrópolis, abrirá, neste sábado (24/5), um novo projeto expositivo que promete grande repercussão. Trata-se de “Insurgências Indígenas: Arte, Memória e Resistência“, que reunirá obras e performances de artistas indígenas aldeados de diferentes partes do país.
A mostra será aberta em etapas – ou em “fogueiras”, terminologia utilizada pela curadoria do projeto. Ela é assinada pela antropóloga e ativista indígena Sandra Benites e pelo curador-chefe do Museu de Arte do Rio (MAR), Marcelo Campos, com a assistência de Rodrigo Duarte, artista visual e ativista socioambiental. O termo fogueiras (TATA YPY, a origem do fogo, em guarani) faz referência às práticas culturais ancestrais de reunião ao redor do fogo. Para a mostra, a palavra se refere aos encontros e debates que abrem cada etapa da exposição.
“É nas fogueiras que há compartilhamento e diálogo aquecido pela força e afeto. É o lugar de encontro de uma comunidade, um lugar de debate, tomadas de decisões, recontar nossas histórias e acordar memórias”, explicam os curadores.
Andrey Guaianá e debate com lideranças indígenas
A primeira fogueira, neste sábado (24/5), será marcada pela inauguração da obra comissionada de Andrey Guaianá Zignnatto, na Galeria Brasil, e por uma conversa entre público, artistas e lideranças indígenas no Salão das Convenções. Participarão Lutana Kokama, Vanda Witoto, Iracema Gãh Té Kaingang e Alice Kerexu Takua, além da curadora Sandra Benites. A atividade, que acontece das 14h às 17h, tem entrada franca. Também haverá transmissão ao vivo através de um link que será disponibilizado em www.sescrio.org.br.
Nascido em Jundiaí (SP), descendente de povos Tupinaky’ia e Gûarini, Andrey é reconhecido por trabalhos que fazem referência ao universo do labor. Neto de pedreiro, do qual foi ajudante quando criança, Andrey utiliza em suas obras materiais como sacos de cimento, tijolos, juntas de argamassa e fragmentos e sobras de intervenções urbanas. Sua intenção é provocar uma reflexão sobre a relação instável e dinâmica que o ser humano estabelece com o meio que o cerca.
Diversidade de povos
A fogueira seguinte será no dia 7 de junho, com o desenvolvimento das obras comissionadas, ou seja, desenvolvidas exclusivamente para a mostra. O público poderá acompanhar o processo de criação dos trabalhos, que envolverá instalações, pinturas e ilustrações. As peças serão criadas por artistas e coletivos de Amazonas, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, dos povos Desana, Baniwa, Anambé, Guarani Nhandeva, Xavante, Guarani, Mbya e Karapotó.
A composição do projeto prossegue no dia 10 de julho, coincidindo com o Festival Sesc de Inverno, quando serão apresentadas obras audiovisuais, incluindo mapping, e inaugurada a obra da artista Tamikuã Txihi no entorno do lago Quitandinha. Para o dia 9 de agosto está prevista a última fogueira, que completa a exposição, com obras que remetem à arte e à memória. A mostra se estenderá até fevereiro de 2026.
Serviço
Exposição | Insurgências Indígenas: Arte, Memória e Resistência
De 24 de maio a 24 de fevereiro
Terça a domingo e feriados, das 10h às 16h30
Período
24 de maio de 2025 10:00 - 24 de fevereiro de 2026 16:30(GMT-03:00)
Local
Centro Cultural Sesc Quitandinha
Avenida Joaquim Rolla, 2, Petrópolis, Rio de Janeiro - RJ
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Uma exposição coletiva multidisciplinar que contempla artes plásticas visuais, com artistas indígenas e periféricos. Serão apresentadas ao público de maneira gratuita, pinturas, fotografias, vídeos e um painel artístico, além
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Uma exposição coletiva multidisciplinar que contempla artes plásticas visuais, com artistas indígenas e periféricos. Serão apresentadas ao público de maneira gratuita, pinturas, fotografias, vídeos e um painel artístico, além de uma programação com bate papo, visita guiada e uma oficina de arte.
O projeto visa apresentar uma parte da riqueza cultural e ancestral dos povos originários e conscientizar e mostrar a importância da defesa e preservação das florestas e dos povos indígenas.
A proposta é trazer um pouco do Alto Xingu e do universo do povo indígena Kuikuru para dentro da galeria. As paredes da galeria serão pintadas com pigmentos extraídos de terra coletada no Alto Xingu durante a imersão cultural realizada em 2023. Grafismos da etnia Kuikuru será reproduzidos e artesanatos e utensílios locais serão expostos. Cânticos locais e sonidos da fauna local farão parte da sonorização do ambiente.
Serviço
Exposição | Rio Acima – Uma Jornada pelo Xingu
De 12 de julho a 12 de outubro
Terça a sábado, de 10h às 17h
Período
12 de julho de 2025 10:00 - 12 de outubro de 2025 17:00(GMT-03:00)
Local
Sesc Niterói
R. Padre Anchieta, 56 - São DomingosNiterói - RJ
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Claudia Andujar é um paradigma internacional de humanismo construído ao longo de décadas de dedicação a seu trabalho com a fotografia. Seu foco sempre esteve, sobretudo, nos
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Claudia Andujar é um paradigma internacional de humanismo construído ao longo de décadas de dedicação a seu trabalho com a fotografia. Seu foco sempre esteve, sobretudo, nos segmentos da população brasileira que viveram à margem da vida, como os migrantes nordestinos, mulheres, afrodescendentes e indígenas do Brasil, entre outros. Nascida numa família judia em 12 junho de 1931 em Neuchâtel na Suíça. Quando ela tinha 5 anos sua família se mudou para a Hungria. Grande parte de sua família era judia. Seu pai foi aprisionado pelos nazistas e morreu num campo de concentração. Com sua mãe, a jovem Claudia se exilou em Nova York durante a Segunda Guerra Mundial, em fuga do Holocausto. Claudine Haas se tornou Claudia Andujar ao se casar com o espanhol Julio Andujar nos Estados Unidos. Em 1955, ela veio morar em vieram para São Paulo.
Desde a infância, Claudia Andujar escrevia poemas e depois passou a pintar até que descobriu a fotografia. “Na pintura, eu me fechava. Na fotografia, eu me abri” Sua entrega política mais surpreendente foi em prol da mudança da consciência coletiva sobre a violência das formas de hegemonia imperantes no país, por grupos que chegaram ao ponto de praticar o genocídio, como no caso dos garimpeiros historicamente espoliados de suas terras e bens e eliminados como povos.
Para Claudia Andujar, a fotografia foi sua arma de “violentação da violência” social, dimensão tomada emprestada de Michel Foucault. O regime ótico de sua produção foi primeiramente marcado pelo compartilhamento de valores éticos necessários ao olhar de compaixão, simpatia e aliança com os dominados e à defesa da vida. Só depois, caberia pensar na excelência estética de sua fotografia.
Sustentabilidade. A conservacionista Claudia Andujar colocou sua câmera a serviço da natureza. Sua produção fotográfica denunciou diante do mundo o genocídio dos povos indígenas da América do Sul, o genocídio, a espoliação das terras e dos saberes indígenas, o garimpo ilegal, inclusive como o envenenamento dos rios amazônico pelo uso do mercúrio.
Ciência. Aconselhada por Darcy Ribeiro, Claudia Andujar se encaminhou para documentar sociedades indígenas sobre o prisma do conhecimento antropológico, incluindo a vida simbólica e a cultura material dos povos originários. Claudia Andujar compõe uma história de mais de 150 anos de emprego da fotografia nesse processo investigativo, ao lado de Sebastião Salgado, Milton Guran, Elza Lima, entre outros – aqui referidos por conta da dimensão estética de suas imagens.
Espiritualidade. Em seus primórdios, algumas sociedades não brancas, consideravam que a fotografia “roubava a alma” dos retratados. Ademais, as sociedades indígenas foram catequizadas por missionários católicos, uma guerra simbólica hoje acirrada pelo exacerbado proselitismo de seitas evangélicas. O delicado respeito ético de Claudia Andujar pelas diferenças e especificidades das crenças resultou numa “arte sacra” sui generis ao registrar com formidável qualidade plástica cerimônias, adereços ritualísticos, cerimônias como a da ingestão dos alucinógenos religiosos, observando teogonias e unidade entre todos os seres que compõe a terra: água, pedras, montanhas, vegetais, animais, um reino da natureza no qual os humanos se inscrevem sem hierarquização de qualquer espécie.
Serviço
Exposição | Claudia Andujar e seu Universo
De 18 de julho a 04 de novembro
Quinta a terça-feira, das 10h às 18h
Período
18 de julho de 2025 10:00 - 4 de novembro de 2025 18:00(GMT-03:00)
Local
Museu do Amanhã
Praça Mauá, 1 - Centro, Rio de Janeiro - RJ
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O IMS Paulista abre a mostra Paiter Suruí, Gente de Verdade: um projeto do Coletivo Lakapoy. A exposição apresenta um acervo inédito de fotografias familiares tiradas majoritariamente pelo povo indigena Paiter Suruí, reunidas e digitalizadas pelo Coletivo Lakapoy. Esse acervo inclui cenas e retratos tirados desde a década de 1970, quando as câmeras chegaram ao território pelas mãos de missionários, mas passaram a ser utilizadas pela população local para registrar seu dia a dia. Além do acervo histórico, a exposição apresenta fotos e vídeos atuais, reforçando o papel da fotografia como importante ferramenta de afirmação dos direitos indígenas.
As imagens do acervo histórico estavam armazenadas nas casas das famílias, guardadas em álbuns, caixas e estantes das diferentes aldeias do território indígena, localizado entre os estados de Rondônia e Mato Grosso. Para preservá-las, o Coletivo Lakapoy – grupo formado por comunicadores indígenas, com o apoio de não indígenas, com o objetivo de fortalecer a cultura Paiter Suruí – reuniu, catalogou e digitalizou as fotografias. Em 2021, o projeto foi publicado na revista ZUM e, em 2023, selecionado pela Bolsa ZUM/IMS, de fomento à produção artística. O resultado dessa pesquisa agora se desdobra nesta exposição, que ocupa o 6º andar do IMS Paulista, com entrada gratuita. (Saiba mais sobre o Coletivo Lakapoy no serviço.)
A mostra tem curadoria da líder e ativista Txai Suruí, que integra o Coletivo Lakapoy, da arquiteta, pesquisadora e curadora Lahayda Mamani Poma e de Thyago Nogueira, coordenador da área de Arte Contemporânea do IMS, além de supervisão do cacique-geral Almir Narayamoga Suruí, nome fundamental da história da luta indígena no Brasil. No sábado (26/7), às 11h, os curadores participam de uma conversa com Almir Suruí e Ubiratan Suruí, do Coletivo Lakapoy, no cinema do IMS Paulista. No domingo (27/7), às 15h, um grupo de anciãos do povo Paiter Suruí conduz uma atividade sobre os cantos tradicionais da sua cultura. Os eventos são gratuitos e abertos ao público.
Na exposição, o público encontra reproduções de cerca de 800 fotografias analógicas, da década de 1970 até 2000, que documentam o dia a dia do território, registrando aniversários, casamentos, batizados e competições esportivas, mas também os desafios decorrentes dos contatos com os não indígenas. Este acervo histórico ocupa todas as paredes da exposição, transformando-as em um grande álbum de família, composto de registros informais e pessoais.A mostra apresenta ainda cerca de 20 retratos recentes do povo Paiter Suruí tirados em maioria por Ubiratan Suruí, primeiro fotógrafo profissional do povo e integrante do Coletivo Lakapoy, além de depoimentos e vídeos dos influencers Oyorekoe Luciano Suruí e Samily Paiter. A exposição também apresenta redes, cestos e colares produzidos pelas artesãs do território, valorizando o conhecimento ancestral e artístico das mulheres Paiter Suruí.
Contatados oficialmente pela Funai em 1969, os Paiter Suruí resistiram a invasões, doenças e à omissão governamental até obterem, em 1983, a homologação da Terra Indígena Sete de Setembro, localizada entre os estados de Rondônia e Mato Grosso. Hoje, são aproximadamente 2.000 pessoas, distribuídas em mais de 30 aldeias. Com um modo de vida integrado à floresta amazônica, mas também profundamente transformado desde o contato com a sociedade não indígena, os Paiter Suruí seguem lutando para garantir sua soberania e a integridade de seu território, ameaçado pelo garimpo, pela pecuária e pelo extrativismo predatório. A fotografia e as redes sociais, entre outras ferramentas tecnológicas, foram apropriadas pela juventude como formas de difundir sua cultura, denunciar invasões e fortalecer a resistência.
Txai Suruí comenta a exposição e a importância de preservar essa memória: “A vontade de guardar, registrar e contar a história do povo Paiter Suruí é um sonho que agora se realiza, antes de os últimos anciãos nos deixarem, antes de essa história se ocultar de vez em algum canto esquecido do tempo, na memória dos que viveram essa saga. […] Com as câmeras nas mãos, vemos um olhar diferente daqueles que vieram de fora, podemos notar a espontaneidade e naturalidade de quem tira fotos para um álbum de família. São imagens cheias de amor, carinho e afetividade, mas também de conhecimento, de amor à humanidade e à natureza, de orgulho de pertencer ao povo Paiter Suruí.”
A maioria das pessoas retratadas nas imagens foram identificadas e contatadas, autorizando a reprodução das fotos, num movimento de propor novas lógicas de construir, guardar e expor acervos indígenas, como pontua a curadora Lahayda Mamani Poma: “De modo geral, o contato entre instituições de arte e culturas originárias abre não apenas para conhecimento de novas produções e linguagens artísticas, mas para a reflexão sobre modos de fazer museologia”.
O curador Thyago Nogueira também ressalta que o acervo é um “documento inédito da história Paiter Suruí, muito diferente das imagens oficiais e etnográficas produzidas sobre os povos indígenas brasileiros”. Segundo o curador do IMS, “montar um acervo visual de um povo é uma forma de refazer laços e dinamizar a própria cultura, criando pontes entre as novas e velhas gerações. É também uma forma de mostrar que as fotografias atuam como ferramenta de resistência e afirmação − uma estratégia que pode interessar a outros povos indígenas e grupos minorizados ou excluídos de sua própria história”.
Essa lógica aparece nas legendas da exposição, elaboradas coletivamente pelos Paiter Suruí, com coordenação de Ubiratan Suruí (ver exemplo abaixo). Essa opção reforça o trabalho coletivo, em contraponto à ideia de autoria individual, já que é frequentemente difícil determinar quem bateu cada foto, pois a câmera circulava entre várias mãos. Outro aspecto importante é a presença de intervenções manuais nas fotografias. Rasuras, desenhos e anotações mostram que estas fotografias são fragmentos de memória vivos, e não apenas documentos do passado.
Ubiratan Suruí, integrante do Coletivo Lakapoy, comenta o processo de construção deste acervo: “Essas fotos foram coletadas nas casas de vários Paiter. Quando muitas delas foram feitas, eu era apenas uma criança. Assim, para entender melhor o que estava vendo e o porquê de cada registro, passamos a ir atrás dos personagens ou seus familiares. Às vezes, a fotografia era brincadeira de criança ou até um disparo acidental de alguém que não estava tão acostumado com a câmera. Mas, como a máquina era analógica, com a limitação dos filmes, a maioria dos cliques era de momentos realmente importantes.” Segundo o fotógrafo, o “acervo catalogado já passou das centenas de registros, e cada um deles traz outra centena de narrativas. Quando um álbum novo é encontrado na aldeia, vários parentes se sentam em volta dele para trocar relatos e lembrar do passado.”
Ubiratan é o autor de parte das fotos contemporâneas exibidas na mostra, tiradas a partir de 2024. As imagens mostram o cotidiano atual das aldeias do território Paiter Suruí, marcadas tanto por costumes tradicionais quanto por novas sociabilidades e pelo uso das tecnologias. A exposição traz também vídeos de entrevistas com lideranças e integrantes da comunidade, como Almir Narayamoga Suruí. Nos depoimentos, as pessoas falam da importância do acervo e comentam temas como política, espiritualidade e alimentação.
Outro destaque, feito especialmente para a exposição, é uma projeção audiovisual que documenta o contato de anciãos do território com as imagens históricas do fotógrafo Jesco von Puttkamer. Jesco participou do contato da Funai com os Paiter Suruí na virada dos anos 1960 para os 1970, e, ao longo da vida, reuniu um dos acervos audiovisuais indígenas mais importantes do país, depositado no IGPA da PUC Goiás. A maioria dos Paiter Suruí, no entanto, nunca havia visto as imagens, que retornaram ao território pela primeira vez depois de uma colaboração entre o Coletivo Lakapoy e o IGPA da PUC Goiás.
Em cartaz até 2 de novembro, a exposição apresenta ao público um conjunto inédito de imagens de grande importância histórica e política. Trata-se de um acervo em expansão, que, em 2026, também será exposto no próprio Território Sete de Setembro.
Serviço
Exposição | Paiter Suruí, Gente de Verdade
De 26 julho a 2 novembro
Terça a domingo e feriados das 10h às 20h (fechado às segundas).
Última admissão: 30 minutos antes do encerramento.
Período
26 de julho de 2025 10:00 - 2 de novembro de 2025 20:00(GMT-03:00)
Local
IMS - Instituto Moreira Salles
Avenida Paulista, 2424 São Paulo - SP
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A Casa de Cultura do Parque inaugura seu II Ciclo Expositivo, que segue até 26 de outubro. A programação gratuita inclui as exposições “Palavra e gesto“, coletiva na Galeria do Parque, “Carolina Colichio: Substrato“, no Gabinete, e “Antonio Pulquério: É de SANTO, é de BARRO“, no Projeto 280X1020. A abertura contará ainda com performances de Antonio Pulquério e da artista indígena colombiana Julieth Morales.
A coletiva “Palavra e gesto”, com texto crítico de Camila Bechelany, reúne trabalhos de Fabio Miguez, Maíra Dietrich, Marcelo Cipis, Marilá Dardot, Monica Barki e Rafael Alonso. As obras exploram a intersecção entre pintura e escrita, tensionando imagem e texto em poéticas verbo-visuais singulares, que remetem à visualidade vernacular e cotidiana.
No Gabinete, a mostra “Substrato” apresenta a pesquisa de Carolina Colichio (Ribeirão Preto, 1977). A artista utiliza fragmentos e imagens de paisagens em cerâmica e pintura, buscando dar visibilidade a existências e propor uma mediação da matéria. Suas peças, que remetem a fósseis e minerais, convidam à percepção do potencial ilimitado das coisas, fomentando uma natureza comum e interconectada.
O Projeto 280X1020 recebe “É de SANTO, é de BARRO”, de Antônio Pulquério (Campos Sales, CE, 1967). A intervenção, que tem performance de abertura do artista em 2 de agosto, subverte a lógica modular minimalista ao usar módulos artesanais de barro queimado. As peças, que remetem a Espadas de São Jorge ou Santa Bárbara, entrelaçam o terreno e o divino, refletindo o sincretismo cultural brasileiro onde santos católicos e divindades africanas se confundem. O texto de apresentação da mostra é de autoria de Tadeu Chiarelli.
Completa a programação de abertura, às 17h, a performance “ANINPI (Agua y sangre)”, da artista indígena Julieth Morales (Colômbia, 1992). A ação ritual, conduzida com sua mãe, explora a identidade cultural feminina e a ancestralidade. As duas recriam o ritual das Mojigangas, usando telas fúcsia e azul – da bandeira Misak – que simbolizam a luta, fertilidade, água e origem de seu povo. A performance harmoniza memória e presente, conectando mundos espiritual, físico e territorial ao som da música tradicional Misak.
As mostras contam com direção artística de Claudio Cretti e são uma idealização do Instituto de Cultura Contemporânea (ICCo). A CASA DE CULTURA DO PARQUE
A Casa de Cultura do Parque, localizada em frente ao Parque Villa-Lobos, no Alto de Pinheiros, em São Paulo, é um espaço plural que busca estimular reflexões sobre a agenda contemporânea, promovendo uma gama de atividades culturais e educativas que incluem exposições de arte, shows, palestras, cursos e oficinas. A Casa de Cultura do Parque tem como parceiro institucional o Instituto de Cultura Contemporânea – ICCo, uma OSCIP sem fins lucrativos. As duas iniciativas, de natureza socioeducativa, compartilham a mesma missão de ampliar a compreensão e a apreciação da arte e do conhecimento.
Serviço
Exposição | II Ciclo Expositivo da Casa de Cultura do Parque
De 02 de agosto a 26 de outubro
Quarta a domingo, das 11h às 18h
Período
2 de agosto de 2025 11:00 - 26 de outubro de 2025 18:00(GMT-03:00)
Local
Casa de Cultura do Parque
Av. Prof. Fonseca Rodrigues, 1300 - Alto de Pinheiros, São Paulo - SP, 05461-010
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Mendes Wood DM tem o prazer de apresentar Nazarethana, exposição individual de Paulo Nazareth, nascido em Nak Borun (território indígena Borun do Vale do Watu [Rio Doce]), Minas Gerais. O artista, que se apresenta como homem velho, traz um vasto corpo de trabalhos inéditos retirados de seus guardados e outros recentes que ocupará todo o galpão da Barra Funda, em São Paulo, promovendo expressivas intervenções no seu espaço através de instalações, fotografias, desenhos, bordados, pinturas, esculturas, objetos e vídeo. Dividida em capítulos, a exposição narra o caminhar do artista somado a trajetória de suas ancestrais: Ana Gonçalves da Silva, sua mãe, e Nazareth Cassiano de Jesus, sua avó, além de divindades, como deuses greco-romanos, africanos e indígenas. Em um diálogo entre as narrativas individuais, familiares e plurais, a mostra cria uma trama entre a oralidade e a história oficial.
A avó de Paulo Nazareth, que trabalhou em fazendas constituídas sobre terras indígenas Boruns, foi enviada por seu “empregador”, (“coronel”, “doutor” delegado, grileiro das terras indígenas) a Colônia de Barbacena (hospital psiquiátrico muito conhecido recentemente devido ao chamado Holocausto Brasileiro revelado há não muitos anos), onde permaneceu internada por duas décadas até ser declarada desaparecida em 1964. Com poucas lembranças de sua mãe, Ana realizou, anos depois, uma viagem organizada por Paulo em busca de suas origens. Em reverencia a sua avó, Paulo Nazareth carrega o seu nome como trabalho de arte preceito e o leva consigo em suas caminhadas ao redor do mundo. “Nazarethana é essa viagem, esse retorno, essa epopeia dentro de nós mesmos. Em Nazarethana, está Nazareth e está Ana, minha mãe e a mãe da minha mãe, juntas, as quais eu levo comigo e sou levado por elas”, pontua o artista.
O prólogo da exposição traz a obra Assembleia de Deuses, um letreiro luminoso que anuncia não somente a pluralidade de deuses, mas reflete a diversidade humana, e a possibilidade de modos de existências múltiplas. Inserido no espaço da galeria, o letreiro transforma o ambiente em templo – casa de reza, lugar de encontro com o intangível, reforçando a arte como um lugar de atingir o não físico e material. Nas palavras do artista, “A Assembleia de Deuses é um letreiro, um anúncio, que se torna instalação, pois ele transforma o lugar e é uma brecha, uma fresta, um desvio do lugar comum.”
A relação com o imaginário coletivo e afetivo reaparece em Cinema tropical, instalação composta por um vídeo e cartazes de filmes. A obra cria uma relação entre ícones visuais da paisagem tropical – imagens e vídeos de coqueiros e palmeiras – criando um cenário imaginado que poderia ser qualquer lugar nos trópicos ou próximo a eles. Projetado para ser exibido durante o inverno, o trabalho carrega imagens para “aquecer corações”, em um cinema como uma promessa de concretude do sonho.
Em diálogo com o seu passado, Paulo Nazareth aposentou há alguns anos as havaianas e passou a produzir os seus próprios calçados, os quais também recebem o nome de Nazarethana – até então, o artista estava andando com os pés descalços e ainda é possível vê-lo caminhando por aí desse modo. Essa prática remonta a história de sua mãe que, quando pequena, não tinha sapatos para usar na fazenda em que trabalhava e confeccionada seus próprios calçados a partir de sobras de couro. O gesto se repete agora como ação artística e política, um fazer que carrega o trabalho de gerações, inclusive do próprio artista, que também trabalhou nessa fazenda durante a juventude. “É esse jogo: Havaiana, sandália usada inicialmente por trabalhadores, bem comum no canteiro de obras: nos pés de pedreiros, serventes, camponeses e trabalhadoras domésticas, e Nazarethana, que seria essa sandália feita por mim mesmo, e ainda tá sendo adaptada, experimentada, muitas vezes me verão descalço enquanto a sandália ainda vem sendo feita… Havaiana remete a um lugar e Nazarethana a outro, ambas são promessas”, esclarece. Nazarethana é mais que tudo uma conversa entre o artista, sua mãe, a mãe de sua mãe e seus infantes, Nazareth aprende consigo enquanto jovem e menino, aprende com a maestria de sua mãe, desde menina até a velhice, e aprende com sua avó em espírito que partiu e se faz presente.
Ao longo da mostra, figuram ainda um caderno de desenhos de sua mãe feitos todos os dias nos últimos meses, uma série de bordados, desenhos e esculturas em bronze de divindades diversas. A conversa com sua herança afro aparece em toda a mostra e é retomada nas fotografias marcadas com pontos riscados feitos com pó de pemba (as fotos são do acervo imaterial do Centro Espírita Caboclo Pena Branca da Comunidade Quilombola Namastê na cidade de Ubá, Minas Gerais). Esses trabalhos expandem o universo da Nazarethana e conduzem ao seu epílogo, que não é o fim, mas movimento de cura e reconfiguração: um convite a imersão em um espaço fechado. No epílogo dessa epopeia, uma piscina de areia dialoga com um bordado na parede onde se lê “Nós podemos nadar / We can swim”. Como parte de sua história, Paulo ainda não aprendeu a nadar por receio de sua mãe dos espíritos das águas e o medo imposto pelos invasores grileiros das terras – contam que o dia em que enviaram Nazareth ao manicômio, ela caminhava em direção ao rio com a filha nos braços, e lutou para que a criança não fosse levada. No piso, bloquetes advindos de Dakar, que representam símbolos da realeza e o baobá que traz a memória ancestral, complementam o ambiente. “Em frente a Ilha de Gorée, Senegal, de onde inúmeras pessoas foram “partidas”, escravizadas y enviadas as Americas, atravessando o Atlântico convertido em cemitério onde muitas adoecidas foram jogadas na boca do Oceano y seus habitantes”, pontua Nazareth.
Nazarethana apresenta-se como uma cartografia das narrativas de Nazareth e de suas linhagens –familiares, divinas e territoriais que atravessam e são atravessadas por histórias locais e universais. Ao reunir o que o artista define como “arte de preceito” – aquilo que é feito como fala, reza, ato sagrado e existência múltipla e “multiversa, pluriversal” –, a exposição propõe um espaço-tempo de comunhão, reflexão e aprendizado de “tempo plural”.
Serviço
Exposição | Nazarethana
De 10 de agosto aa 28 de setembro
Terça a sábado, das 11h às 19h
Período
10 de agosto de 2025 11:00 - 28 de setembro de 2025 19:00(GMT-03:00)
Local
Mendes Wood DM
Rua Barra Funda, 216, São Paulo – SP
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A obra de Joseca Mokahesi Yanomami (1971, Rio Uxi u, Terra Indígena Yanomami, Brasil) tem como ponto central a tradução da cosmologia yanomami em narrativas visuais, especialmente no desenho, dando corpo às histórias dos tempos ancestrais e às múltiplas dimensões da terra-floresta, conceito que vai além de um espaço físico e une a floresta, os rios, os espíritos, os animais e os humanos em um sistema vivo e interdependente, visível somente aos xamãs. É nessa atmosfera quase onírica que a Almeida & Dale inaugura, a partir de 16 de agosto, Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta, individual do artista com curadoria de Bruce Albert, antropólogo franco-marroquino e autor, junto a Davi Kopenawa Yanomami, dos livros A Queda do Céu (2015) e O Espírito da Floresta (2022).
Os desenhos e telas de Joseca apresentam, com minúcias e cores vibrantes, entidades, lugares e episódios evocados pelos cantos dos grandes xamãs de sua comunidade, nos conduzindo por universos onde humanos e não-humanos se entrelaçam em uma rede complexa, cujas imagens são reveladas aos xamãs por meio de sonhos e cantos. Inspirado pelos seus sonhos, o artista transpõe, sobre papel ou tela, suas próprias imagens sonhadas, alcançando os múltiplos universos que constituem a “terra-floresta-mundo”, urihi a. Assim, seus sonhos se transformam um após o outro em “peles de imagens” (utupa siki) que nos dão acesso à saga dos ancestrais do “primeiro tempo” yanomami.
A exposição Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta nos apresenta cerca de 30 obras que são espécies de “capturas de tela” oníricas, stills do filme metafísico desenrolado pela trama narrativa ancestral dos cantos xamânicos yanomami. “Para tornar visível e fazer conhecer o poder desse pensamento onírico para além de seu próprio mundo, Joseca Mokahesi Yanomami se apropriou de certos traços de nosso realismo figurativo com o qual foi confrontado na escola de sua comunidade quando adolescente. Desde então, ele passou a transformálos a serviço de um estilo radicalmente original que poderíamos qualificar de “realismo xamânico”, em alusão ao célebre “realismo mágico” literário”, explica o curador Bruce Albert.
Parte fundamental da mostra, os trabalhos da série Urihi a në mari vêm acompanhados de títulos-descrições escritos por Joseca na língua yanomami e que partilham sua cosmovisão. Para além do gesto artístico, sua produção é também um movimento de tradução entre mundos. Trata-se de uma linguagem híbrida, mas enraizada na cosmologia yanomami, que visa comunicar com os mais jovens de sua comunidade e sensibilizar os não-indígenas (napë pë) para a beleza, profundidade e urgência de preservar esse modo de vida ameaçado.
Serviço
Exposição | Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta
De 16 de agosto a 11 de novembro
Segunda a sexta-feira, das 10h às 19h, sábado, das 11h às 16h Entrada gratuita
Período
16 de agosto de 2025 10:00 - 11 de outubro de 2025 19:00(GMT-03:00)
Local
Almeida & Dale
Rua Fradique Coutinho 1360 | 1430, São Paulo - SP
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o Museu A CASA do Objeto Brasileiro recebe a exposição Xingu – Reflexos Indígenas no Design Contemporâneo, que revela o resultado de um processo colaborativo entre a designer Maria Fernanda Paes de Barros, da Yankatu, e os artesãos do povo Mehinaku, do Alto Xingu (MT), em uma potente confluência entre o design e os saberes indígenas. Realizada pela Yankatu e pelo Ministério da Cultura, por meio da Lei de Incentivo à Cultura, a ação conta com patrocínio da Sherwin-Williams do Brasil.
“A ideia do projeto nasceu há cerca de cinco anos, a partir de uma imersão que realizei sozinha na aldeia Kaupüna para desenvolver uma coleção de peças em parceria com a comunidade. Durante esse processo, tive a ideia de fazer o tingimento natural de fios de algodão utilizados na produção de algumas peças — o que despertou neles um interesse genuíno pela técnica. A partir dali, ficou evidente o potencial de um diálogo que respeitasse profundamente os modos de fazer tradicionais, sem modificá-los, mas ampliando suas possibilidades de aplicação em novas criações”, explica Maria Fernanda, idealizadora do projeto.
A exposição propõe uma imersão do visitante pelo território artístico dos Mehinaku, reunindo objetos tradicionais – como bancos zoomorfos, cestarias e esteiras – e peças inéditas desenvolvidas em conjunto com a designer. Nas novas obras, Maria Fernanda evidencia o buriti, palmeira nativa que é a principal matéria-prima do trabalho das mulheres da etnia, e também os fios de algodão que ganham tingimentos naturais a partir de cascas de árvores nativas do entorno da aldeia. As obras refletem uma convivência imersiva e uma escuta sensível ao tempo e às necessidades da comunidade. Segundo a designer, a exposição apresenta como as criações ganham corpo, e o repertório da arte e do design brasileiros se expande, quando as interações são construídas de maneira ética, cuidadosa e horizontal.
Oficinas de tingimento natural aproximam técnicas ancestrais e inovação sustentável
Durante o processo de criação, o projeto promoveu oficinas de tingimento natural com mulheres da aldeia Mehinaku, reforçando seu caráter formativo e colaborativo. Para conduzir as atividades, foi convidada a pesquisadora Maibe Maroccolo, da Mattricaria, uma especialista em tingimento que tem mapeado o potencial tintorial de diferentes biomas brasileiros. A oficina propôs um intercâmbio de conhecimentos entre as técnicas ancestrais de tingimento já utilizadas pelos artesãos e práticas contemporâneas, despertando interesse e protagonismo das artesãs. O resultado gerou uma paleta de 12 cores que aparecem entrelaçadas em diferentes obras da mostra.
Além da exposição, o público terá acesso a um minidocumentário inédito, que narra a trajetória do projeto e apresenta seus principais agentes e processos criativos. Também será disponibilizado gratuitamente um catálogo virtual, que contextualiza as ações do projeto e a parceria entre a Yankatu e os Mehinaku, com imagens, depoimentos e reflexões sobre o fazer artesanal e suas transformações.
A expografia da mostra será feita com tonalidades do catálogo da Sherwin-Williams, líder mundial em tintas e revestimentos, cuidadosamente escolhidas para valorizar as obras e aumentar o destaque das peças. “Acreditamos no poder da cor como ferramenta de expressão e conexão, e é uma alegria as nossas estarem presentes na exposição Xingu, ajudando a contar essa história tão rica de saberes, trocas e criatividade. Projetos como esse reforçam a importância do diálogo entre passado e presente, tradição e inovação, e nos mostram como a cultura pode inspirar novas formas de ver e viver o design.”, afirma Patrícia Fecci, gerente de Color Marketing e especialista em cores da Sherwin-Williams.
A mostra foi pensada para garantir plena acessibilidade ao público. O minidocumentário contará com tradução em LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), os textos da exposição estarão disponíveis em Braile, e o espaço expositivo do Museu A CASA dispõe de rampas e banheiros adaptados para pessoas com mobilidade reduzida. Além disso, os monitores foram capacitados para atender visitantes com deficiências cognitivas, promovendo uma experiência acolhedora, inclusiva e sensível às diferentes formas de percepção.
A exposição Xingu – Reflexos Indígenas no Design Contemporâneo poderá ser visitada gratuitamente no Museu A CASA (Av. Pedroso de Morais, 1216 – Pinheiros, São Paulo/SP), de quarta a domingo, das 10h às 18h, e fica em cartaz até o dia 26 de outubro.
Serviço
Exposição | Xingu – Reflexos Indígenas no Design Contemporâneo
De 17 de agosto a 26 de outubro
De quarta a domingo, das 10h às 18h
Período
17 de agosto de 2025 10:00 - 26 de outubro de 2025 18:00(GMT-03:00)
Local
Museu A CASA do Objeto Brasileiro
Avenida Pedroso de Morais, 1216, Pinheiros, São Paulo, SP
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O Museu da Inconfidência apresenta a exposição “À Espreita do Desvio“, do artista mineiro Ricardo Homen. A mostra apresentará obras de diferentes formatos e períodos da carreira do artista.
Na fronteira entre o rigor estérico e o imprevisível, Ricardo Homen constrói um universo onde linhas, cores e estruturas revelam uma inquietude. Sua obra não se contenta mais com a repetição, agora cria-se um campo de tensão onde nascem formas que se fundem e dão vida a um “terceiro elemento”: o que era retilíneo, se desvia; o que era previsível, se espreita.
Não se trata de abandonar a linguagem construída, mas de submetê-la a uma torção interna. Formas antes definidas agora se refratam, como se buscassem respirar e expandir-se para além de seus limites. Essa emancipação da rigidez não é um acidente, mas uma busca consciente — um ato de desafio ao ciclo infinito do “refazer o mesmo”.
Serviço
Exposição | Xingu: Reflexos Indígenas no Design Contemporâneo
De 17 de agosto a 26 de outubro
Quarta a domingo, das 10h às 18h
Período
17 de agosto de 2025 10:00 - 26 de outubro de 2025 18:00(GMT-03:00)
Local
Museu A CASA do Objeto Brasileiro
Avenida Pedroso de Morais, 1216, Pinheiros, São Paulo, SP