Exposição 'Bloco do Prazer', no Museu de Arte do Rio (MAR)
Exposição 'Bloco do Prazer', no Museu de Arte do Rio (MAR)

A apropriação de um museu pelos moradores da cidade onde ele se encontra é um dos méritos alcançados pela mostra FUNK: Um grito de ousadia e liberdade, em cartaz até 24 de agosto no Museu de Arte do Rio (MAR). Ela foi inaugurada em setembro do ano passado, portanto há dez meses, e a lotação que se via no último dia 23 de julho, de visitação gratuita, surpreendeu até mesmo a equipe do museu: a fila para entrada se estendia para as calçadas e certamente a espera alcançava ao menos uma hora.

Está no DNA do museu a ligação com seu entorno: muitas foram as exposições nestes últimos 11 anos que trataram de temas essencialmente cariocas e o funk, sem dúvida, faz parte dessa linhagem. Não só a temática local, como a própria disposição de obras segue o estilo MAR, o que significa uma verdadeiro avalanche visual no andar que a exposição ocupa. No caso agora são 900 itens em exposição, com obras de arte como eixo principal, mas incluindo roupas, capas de discos e tantos elementos que ajudam a tratar do funk, como as pick-ups e toca-discos para DJ, com direito a participação do público.

Nesse sentido, a mostra, com curadoria da Equipe MAR junto a Taísa Machado e Dom Filó e a consultoria de uma dezena de especialistas, entre eles Deise Tigrona, é um apelo a todos os sentidos, o sonoro especialmente. A primeira sala se dedica ao Soul, movimento de músicas importadas dos anos 1970 e 1980, com ampla repercussão por aqui, influenciando moda e atitude. A foto de Alfredo Rizzuti, com Wilson Simonal recebendo James Brown, em 1973, no aeroporto de Congonhas, é um dos ícones desse momento na mostra.

Já a segunda sala é dedicada aos bailes de favela, que, segundo Marcelo Campos, curador-chefe do MAR, “constitui, talvez, uma das maiores forças de produção artística carioca e nacional”. A exposição inclui obras de artistas contemporâneos, como André Vargas, Gê Vianna, Manuela Navas, Maxwell Alexandre, Emerson Rocha e Bruno Lyfe, entre os cerca de cem brasileiros e estrangeiros presentes.

A expografia assinada pelo Estúdio Gru.a. é tão instagramável que boa parte dos visitantes se registrava ao longo da exposição, o que acontecia também em outra mostra no museu, Bloco do Prazer, que tem na música seu princípio. Ela é inspirada nos versos de Fausto Nilo e Moraes Moreira para a canção Bloco do Prazer (1982), mas conhecida pela interpretação definitiva de Gal Costa. Com curadoria de Marcelo Campos, Amanda Bonan, Thayná Trindade, Amanda Rezende, Jean Carlos Azuos e do curador convidado Bitú Cassnudé, Bloco do Prazer se debruça sobre festas e celebrações que configuram momentos de alegria, catarse, transe e desejo da cultura brasileira, como as fantasias exageradas de Clóvis Bornay, ícone do carnaval carioca.

Com 350 trabalhos, a mostra tem em Gal Costa uma figura central, incluindo aí o Penetrável da Gal, feito em sua homenagem por Hélio Oiticica em 1970, assim como a faixa Fa-tal, criada por Waly Salomão, Luciano Figueiredo, Óscar Ramos, em 1971, para o espetáculo Fa-Tal: Gal a Todo Vapor, dirigido por Salomão. Além do penetrável, o mural Cariri Delícia, de Charles Lessa, é dos mais disputadas pelo público como cenário de autorretratos.

Com as duas mostras, o MAR segue relacionando cultura e arte de forma visceral, conquistando públicos que não são usuais em museus, e apontando como instituições podem repensar suas funções a partir do diálogo com o contexto.


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