Gildo Xavier, João Pessoa, Retrato de Famílias, 2017, acrílica sobre tela

A arte ajuda a se libertar e a lidar com o sofrimento. Há alguns anos vivemos uma grande reviravolta no Brasil e no mundo com a convocação de diferentes forças, tanto políticas, como religiosas e sociais, que optaram por ideários e estratégias ideológicas já ultrapassadas há mais de 50 anos.

De repente, nossa falta de soluções econômicas, nossa decepção com a administração do Estado e o comportamento de partidos e instituições e o fracasso das elites, incapazes de dividir nada, se tornaram terreno propício para a escolha pelo atraso, ao contrário de países desenvolvidos que tiveram o papel de zelar pelo cidadão comum, produzindo certo avanço na democracia e nos costumes.

É interessante ver que, apesar de tudo ter começado como um argumento de certos grupos isolados que enalteciam a luta contra a corrupção, rapidamente isto se mostrou “secundário” e até falso.

As máscaras caíram, como na pintura de Andre Griffo, nas páginas desta edição, e o verdadeiro discurso apareceu: “a ideologia é pior que a corrupção” disse nas midias o ciais Jair Bolsonaro, Presidente eleito no Brasil por 1/3 dos votos no país.
Não tenha a menor dúvida, o que importa é a ideologia. A ideologia de cada um é nosso capital cultural, o que pensamos sobre… no que acreditamos… o que valorizamos e a quem. O quanto nos indignamos com o sofrimento que nos é impingido e aos outros. Quais são nossos valores? Nossa ética. E, é verdade, dependendo de tudo isso, você até também vai ser um corrupto.

Detalhe da obra Pregação, 2017, de Antonio Obá exposta no Museu de Arte do Rio de Janeiro. Foto: Patricia Rousseaux

Na arte, a capacidade de criar e falar é infinita. Por isso, também a arte é passível de censura. À arte nada escapa. A arte tem a capacidade de fazer pensar, antes de obedecer. E tem a capacidade de criar disrupções molestas seja quando é explícita ou quando é sutil. O fato de entrarmos em contato com a obra já é mobilizador.
Não obstante, em momentos agudos de enfrentamento, a arte se torna um canal libertador e muitos artistas escolhem a obra e seu trabalho como forma de militância. Não por nada, de um jeito ou de outro, nossas edições deste ano trazem exposições e coletivas plenas de significados.

Hoje, nos perguntamos. Quem decidiu que este é um País de brancos? Os brancos. Quem decidiu que este é um País de indivíduos sem autonomia na escolha de gênero? Os brancos e negros incapazes de respeitar as diferenças. Quem decidiu que a escola não vai ser um espaço democrático para discutir as diferentes ideologias? Os brancos e negros incapazes de respeitar as diferenças e que têm, sim, uma determinada ideologia. Quem decidiu que o Estado não é mais laico? Os brancos e negros incapazes de respeitar as diferenças e que têm uma determinada ideologia e que defendem sim, uma religião só. Na contra mão, nós, vamos em frente, com tudo aquilo que aprendemos, acompanhamos e respeitamos do que é produzido e criado na diversidade deste país.

Como símbolo, está aí na capa, Rubem Valentim, brasileiro, negro, pintor da década de 50/60, maravilhoso, seja como construtivista ou exímio representante da sua “ideologia”. E dentro da edição uma coletânea de textos, artigos, memórias, exposições e obras que representam em toda sua magnitude uma enorme quantidade de trabalho pelo desejo de liberdade. Boa leitura!


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