A obra de Joseca Mokahesi Yanomami (1971, Rio Uxi u, Terra Indígena Yanomami, Brasil) tem como ponto central a tradução da cosmologia yanomami em narrativas visuais, especialmente no desenho, dando corpo às histórias dos tempos ancestrais e às múltiplas dimensões da terra-floresta, conceito que vai além de um espaço físico e une a floresta, os rios, os espíritos, os animais e os humanos em um sistema vivo e interdependente, visível somente aos xamãs. É nessa atmosfera quase onírica que a Almeida & Dale inaugura, a partir de 16 de agosto, Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta, individual do artista com curadoria de Bruce Albert, antropólogo franco-marroquino e autor, junto a Davi Kopenawa Yanomami, dos livros A Queda do Céu (2015) e O Espírito da Floresta (2022).
Os desenhos e telas de Joseca apresentam, com minúcias e cores vibrantes, entidades, lugares e episódios evocados pelos cantos dos grandes xamãs de sua comunidade, nos conduzindo por universos onde humanos e não-humanos se entrelaçam em uma rede complexa, cujas imagens são reveladas aos xamãs por meio de sonhos e cantos. Inspirado pelos seus sonhos, o artista transpõe, sobre papel ou tela, suas próprias imagens sonhadas, alcançando os múltiplos universos que constituem a “terra-floresta-mundo”, urihi a. Assim, seus sonhos se transformam um após o outro em “peles de imagens” (utupa siki) que nos dão acesso à saga dos ancestrais do “primeiro tempo” yanomami.
A exposição Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta nos apresenta cerca de 30 obras que são espécies de “capturas de tela” oníricas, stills do filme metafísico desenrolado pela trama narrativa ancestral dos cantos xamânicos yanomami. “Para tornar visível e fazer conhecer o poder desse pensamento onírico para além de seu próprio mundo, Joseca Mokahesi Yanomami se apropriou de certos traços de nosso realismo figurativo com o qual foi confrontado na escola de sua comunidade quando adolescente. Desde então, ele passou a transformálos a serviço de um estilo radicalmente original que poderíamos qualificar de “realismo xamânico”, em alusão ao célebre “realismo mágico” literário”, explica o curador Bruce Albert.
Parte fundamental da mostra, os trabalhos da série Urihi a në mari vêm acompanhados de títulos-descrições escritos por Joseca na língua yanomami e que partilham sua cosmovisão. Para além do gesto artístico, sua produção é também um movimento de tradução entre mundos. Trata-se de uma linguagem híbrida, mas enraizada na cosmologia yanomami, que visa comunicar com os mais jovens de sua comunidade e sensibilizar os não-indígenas (napë pë) para a beleza, profundidade e urgência de preservar esse modo de vida ameaçado.
Serviço
Exposição | Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta
De 16 de agosto a 11 de novembro
Segunda a sexta-feira, das 10h às 19h, sábado, das 11h às 16h Entrada gratuita
16 de agosto de 2025 10:00 - 11 de outubro de 2025 19:00(GMT-03:00)
Almeida & Dale
Rua Fradique Coutinho 1360 | 1430, São Paulo - SP