Page 42 - artebrasileiros-66
P. 42
GUERRA CULTURAL HISTÓRIA
O professor e crítico literário João Cezar de
Castro Rocha fala sobre as várias faces do
discurso da extrema direita: autoritarismo,
guerra cultural e caos cognitivo
por maria hirzman
A CIVILIZAÇÃO
EM DISPUTA
o historiador e professor de literatura compa- João Cezar de Castro Rocha – Vamos pensar
rada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, João juntos. A guerra cultural é uma ponta de lança da
Cezar de Castro Rocha, dedicou-se a examinar o dis- extrema direita transnacional e é um movimento
curso da extrema direita na tentativa de compreender muito bem articulado. A ideia central é que, para
as razões do movimento, suas estratégias e os cami- realmente chegar ao poder, é preciso fazê-lo atra-
nhos que levaram à radicalização, em todo o mundo vés da conquista de corações e mentes. Ou seja,
e particularmente no Brasil. País que, segundo ele, através da cultura. Daí a extrema direita no mundo
seria “um laboratório mundial de criação metódica da inteiro tem como alvos preferenciais a imprensa
realidade paralela”. Sintetizada em livros como Guerra livre, a arte e a universidade: instâncias críticas de
Cultural e Retórica do Ódio, de 2021, e Bolsonarismo: reflexão sobre a realidade. É uma espécie de leitura
da Guerra Cultural ao Terrorismo Doméstico, de 2023, enviesada, perversa, do conceito de hegemonia do
sua análise trata o discurso radicalizado como um pro- Antonio Gramsci. Em 1992, Pat Buchanan (que se
cesso narrativo e sugere caminhos de interpretação candidatou às primárias presidenciais do Partido
e enfrentamento por meio do diálogo e do afeto. Em Republicano) surpreendeu o mundo ao dizer em
entrevista à arte!brasileiros, ele fala sobre as origens seu discurso que aquela não era uma eleição como
e desdobramentos do uso da retórica do ódio, que com- as outras: “We are fighting for the soul of America”,
bina negação absoluta da diversidade, caos cognitivo e diz ele literalmente. A comparação aqui seria com
criação de uma midiosfera perversa, fortalecendo um a fala de Michelle Bolsonaro na manifestação de 25
discurso autoritário e teocrático de poder. de fevereiro último, na Paulista.
– A Guerra Cultural é uma das marcas – Eles repetem isso o tempo todo, buscando
da nossa história recente. Como você define o alimentar essa sensação de novidade, pressão e
fenômeno? guerra, para que não abaixem a guarda.
42