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Sheroanawe Hakihiiwe Toho toho [Fungo] [Fungus], 2018 Acrílica sobre
papel de cana-de-açúcar [Acrylic on sugarcane paper] 70 x 50 cm
com as pessoas do seu povo”. Momentos em que ele curador. “O que eu acho, muitas vezes, é que o trabalho
recolhe referências diversas da “cosmo ecologia” de dele se encontra com todos esses trabalhos tidos como
sua comunidade, “uma relação com o ambiente, com o conceituais, minimalistas, mas ele tem uma natureza
cosmos, mais profunda e complexa”. Segundo Ribeiro, diferente. De alguma maneira, a presença dele subverte
Sheroanawe observa os padrões que são utilizados na um pouco esse cânone, aquilo com que a gente está
pintura facial, na pintura corporal ou na produção da tão acostumado. O trabalho dele traz essas fricções,
cestaria, detalhes de animai, plantas, pedras. essas tensões”.
“E é um olhar bastante minucioso que ele lança sobre Para Mesquita, a escolha de Sheroanawe pela
o entorno, sobre as pessoas, sobre o ambiente onde ele repetição, serialização ou minimalismo se dá “em
vive. E do qual ele vai extraindo sínteses”, diz. “Numa referência às pinturas corporais da comunidade, numa
floresta, nessa confusão de elementos, Sheroana- busca por preencher todos os espaços possíveis, numa
we busca as unidades mínimas dessa grandiosidade, folha de papel, com um mesmo símbolo, que é um
pequenos símbolos, que ele transpõe para o papel, pouco dessa prática que a comunidade tem da pintura
que são representações dessa complexidade. Como corporal de preencher todo o corpo com o mesmo
a Laura Barbata afirma, o trabalho dele é mais do que desenho”, conclui.
abstração simples ou minimalismo, é um mapa bastante Por fim, Ribeiro ressalta também como Sheroanawe
complexo de uma infinidade de significados que ele tem um olhar muito sensível para a floresta e atribui
apreende a partir de sua observação”. uma grandiosidade para coisas às quais a gente mal dá
Mesquita comenta que, inicialmente, ao observar importância, a exemplo de uma gota de orvalho numa
a produção de Sheroanawe, uma relação com o mini- teia de aranha pela manhã. Ele salienta, ainda, que o
malismo veio à sua cabeça, um pouco por causa da artista coloca tudo em pé de igualdade, seja a pintura
sua formação “como pesquisador, muito interessado, facial, uma pata de animal, uma folha, tentando nos
já há muitos anos, nas práticas da arte conceitual”. Em dizer que tudo isso é a mesma coisa.
algum momento, afirma o curador, aparecem na prática “E não à toa esse foi o título que ele sugeriu para a
de Sheroanawe “processos como a serialização a repe- exposição, tudo isso somos nós. Tudo aquilo constitui
tição”, que já vimos em diversos trabalhos de artistas o povo ianomâmi. Não existe diferença entre o que é
norte-americanos, europeus ou brasileiros. humano, o que é animal, o que é vegetal e o que é mineral.
“Mas a gente não faz essa leitura da obra do She- Tudo isso precisa ser conservado em conjunto, cuidado
roanawe e nem tenta canonizá-lo, no sentido de trazer em conjunto. É um conceito de meio ambiente de uma
sua produção para uma leitura ocidental”, pondera o sofisticação muito grande”.
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