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8 DE JANEIRO DE 2023 ARTIGO
forma “democrática”, nada parecia salvar-se de sua fúria. um final, um grau zero para que, na sequência, a elite
No entanto, parece que existia naquele sujeito um reacionária tomasse conta do país. Daí a importância
vislumbre de consciência de que, de fato, aquele relógio simbólica do relógio que pertencera a D. João 6º.
não era – ou não deveria ser –, um objeto qualquer. E Daí também a importância simbólica da destruição
talvez tenha sido essa percepção que o levou a querer das peças da galeria de imagens dos presidentes e da
destruir a câmera de vigilância. presidenta que ornava uma área do Palácio do Planalto.
De qualquer maneira, ao arremessar o relógio de D. Arruinar aquelas imagens complementava a alegoria
João vi ao chão, aquele homem buscou parar o tempo, em que se transformou aquela invasão: deter o tempo,
transformando aquela invasão numa quebra, numa mas, igualmente, romper e destruir a história, o passado
espécie de hiato. brasileiro – sempre o maior desejo bolsonarista.
Se os invasores do Capitólio visavam impedir a A questão não era destruir a imagem de todos os
diplomação de Biden, conquistando de novo o poder ex-presidentes e da presidenta, a questão era retirar,
para seguir em frente, os “nossos” invasores tinham dessa espécie de cronologia iconográfica, a imagem do
outra meta. O interesse ali não era dar continuidade “mito”. Uma iconoclastia seletiva. A imagem do sujeito
ao processo histórico, invertendo seu rumo (como os meio atônito, meio parvo, segurando a fotografia de
invasores “deles”), o propósito era detê-lo. Era instituir Jair Bolsonaro em frente às outras imagens, destruídas,
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