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REPORTAGEM IMAGENS DE CONFLITO








                                                      Trabalhos de Peter Van Agtmael, Steve
                                                      McQueen e Emily Jacir refletem sobre
                                                      conflitos e não nos deixam esquecer
                                                      de suas consequências cruéis

                                                      por miguel groisman



            O QUE ACONTECE


            QUANDO NÓS


            DESFAZEMOS O MUNDO?












            em 13 De novembro De 2015, o fotógrafo estadunidense   em tradução livre). Nele, as fotos sequenciadas de
            Peter Van Agtmael estava em Paris durante um ataque   forma não linear entrelaçam e costuram a guerra no
            terrorista massivo efetuado pelo grupo Estado Islâmico  Iraque durante o tempo do ei, o êxodo em massa de
            (ei). À noite, ao retornar para o quarto de hotel, Peter se   refugiados para a Europa, militarismo, terrorismo,
            sentiu paranóico pela primeira vez em muito tempo. “Eu  nacionalismo, criação de mitos e a propaganda de
            já havia coberto conflitos por dez anos e sempre tinha   guerra. O material reunido em Sorry for the War (cujos
            sido capaz de me preparar [psicologicamente] para a   textos e legendas vêm escritos em inglês e árabe) nos
            experiência. Naquela vez, pego de surpresa, fiquei meio   lembra que, embora as guerras recentes dos Estados
            acordado a noite toda”, conta. O choque continuou  Unidos tenham sido praticamente esquecidas, suas
            a reverberar, mesmo após o fotógrafo retornar para   consequências continuam a reverberar, como nota
            casa, em Nova York. Até lá, ao usar o metrô, Peter se   o autor. Os registros perturbadores, de humor ácido
            via mantendo as costas contra a parede, quando pos- (acentuado pela plasticidade trazida no uso do flash
            sível, e examinando cada rosto, ao mesmo tempo que   e pela ordenação astuta das imagens no livro), con-
            mapeava suas rotas de fuga. “Sempre fui um visitante   traditórios, misteriosos e, por vezes, condenatórios,
            dos conflitos de outras pessoas, mas em Paris, quando   são articulados por Peter para estudar a construção
            a violência chegou tão repentinamente em um espaço   da ideia, de uma guerra sem fim. Embora mostre um
            que eu associava com conforto e santuário, tive uma   mundo pós 11 de setembro - “ataque que ‘nos deu
            pequena compreensão do que as pessoas comuns    licença’ para usar nossos medos como desculpa para
            que vivem em uma guerra sentem todos os dias. Dez  qualquer coisa” -, Sorry for the War cumpre o dever de  FOTOS: PETER VAN AGTMAEL/MAGNUM PHOTOS. CORTESIA DO FOTÓGRAFO
            anos de trabalho em conflito e eu havia perdido uma   utilizar a história recente como guia, mas não limitar-se
            das lições mais fundamentais”.                  a ela, já que “também deve-se olhar para a totalidade
              Tal dissonância entre as percepções, dos esta- da história americana como uma estrutura: as coisas
            dunidenses, quanto às guerras pós 11 de setembro   não acontecem apenas por causa de um evento, elas
            e a violência vivida por pessoas presas em zonas de   acontecem como parte do continuum da história”. Fora
            conflito é o pilar narrativo do mais recente projeto de   do front, o fotógrafo foca nas sequelas dessa cultura,
            Peter, Sorry for the War (Nos perdoem pela guerra,  “servindo tanto como evidência quanto interpretação

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