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NAS BORDAS ALI
A ali surge realmente porque Localizada no extremo Leste de São Paulo e com
temos esse entendimento quase 300 mil habitantes, a CT é um distrito da capital
de que a arte é uma que foi ocupado principalmente após os anos 1980 e
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manifestação política. E não que reúne o maior complexo de conjuntos habitacionais
estou falando de uma arte da América Latina. Neste universo vasto e diverso, ape-
sar da notável ausência do Estado, estão organizados
panfletária, mas em relação dezenas de grupos e coletivos de poesia, slam, grafite,
à criação, ao pensamento. teatro, música e outras áreas artísticas – como Pombas
ANDRÉ KOMATSU Urbanas, Red7, Luau Raiz Quadrado, Aliança Negra,
Filhas da Dita e Instituto du Gueto –, com atuações
dentro e por vezes fora do próprio território.
“Eles sabem que têm uma grande potência lá. Assim
como nós sabemos que a cultura brasileira descentra-
lizada, surgida nas periferias de modo geral, talvez seja
hoje o que há de mais forte no país”, afirma Dunley. “E
integrantes da ali alguns já militavam no grupo político essa riqueza cultural que não precisa de nós, eles não
Jararaca, enquanto outros estavam envolvidos com a dependem de a gente chegar lá e dizer que quer trocar
Ocupação 9 de Julho. uma ideia. Então pensamos muito sobre isso ao longo
“E a ali surge realmente porque a gente tem esse dos meses, de como poderíamos atuar. Porque, ao
entendimento de que a arte é uma manifestação política. mesmo tempo, achamos que temos algo para oferecer.
E não estou falando de uma arte panfletária, mas em Então queremos ensinar e aprender, trocar, fazer juntos.”
relação à criação, ao pensamento”, completa Komatsu.
Com a ideia de formar uma escola de arte aberta e via De mão Dupla
itinerante, os membros passaram a manter encontros Sabendo também do longo histórico de promessas
semanais para discutir os possíveis formatos. Desde o não cumpridas que acompanha a vida nas periferias
início, definiram duas diretrizes principais para o projeto: urbanas – seja por parte de políticos, do poder público,
ele estaria relacionada à formação – seja prática ou de organizações privadas ou indivíduos –, os mem-
teórica –, ligada não só à arte, mas à filosofia, história do bros da ali entenderam que o maior desafio do grupo
Brasil e à construção coletiva de conhecimento; e estaria estaria no estabelecimento de um diálogo orgânico e
focado também na formação de redes culturais, com um profícuo com moradores e coletivos da CT, buscando se
trabalho que buscasse o diálogo e a troca com outros afastar de um modelo colonizador de atuação. “Somos
grupos. “Nesse sentido, sempre pensamos o projeto brancos, de classe mais alta e moramos no centro. E são
como uma ponte que pudesse viabilizar a circulação e muitos os projetos que chegam nas periferias ditando
a mobilidade. Uma ponte que pudesse ir do centro para regras, com uma suposta superioridade de quem tem
a periferia e da periferia para o centro”, diz Dunley, que informação e dinheiro”, afirma Komatsu. “Nossa ideia
explica que os planos de itinerância da ali ainda podem sempre foi outra.”
abranger, ao longo dos anos, as cinco zonas da cidade. A Após longo período de reuniões e um intenso proces-
proposta de iniciar o trabalho na Cidade Tiradentes (CT) so de aproximação com a CT – facilitado pelo trabalho
partiu de Sara Ramo, que já havia trabalhado no local do Antonio Guerra –, os primeiros cursos da ali : leste
(na produção do curta-metragem “Lança”) e conhecia começaram a ser oferecidos em meados de 2019 em
coletivos e jovens da região. diferentes espaços do bairro, de bares e praças até o
“Porque a ideia era criar um projeto que saísse Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes (vincu-
aqui da nossa bolha, do centro comercial, e fosse para lado à Prefeitura e com o qual a ali estabelece parcerias
lugares mais distantes”, conta Komatsu. Neste caso, pontuais). Um curso voltado para questões urbanísticas
foi escolhido um lugar onde inclusive o candidato da e de uso do espaço público foi ministrado por Renata
extrema-direita saiu vencedor nas eleições, apesar Lucas, enquanto outro de história da arte, desenho e
do histórico de lutas progressistas na região. Como pintura foi comandado por Dunley, Rodrigo Andrade e FOTOS: DING MUSA; LUA PORTO
ressalta o artista, a formação da ali partiu, também, de Ana Prata. Foi mais ou menos neste período, a partir de
uma tentativa de compreensão e atuação neste novo agosto, que a ali passou a captar seus primeiros recursos
contexto político brasileiro. através da venda de pequenas caixas com obras de arte
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