Page 72 - ARTE!Brasileiros #45
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EXPOSIÇÃO SÃO PAULO






             VOCÊ SONHA COM O QUÊ?





             COLETIVA ALÇA VÔO NA GALERIA LUISA STRINA, COM PLAFORMA PAVIMENTADA PELA OBRA
             A FLOR MOHOLE, DE DAVID MEDALLA E OS ESPAÇOS VIRTUAIS DE CILDO MEIRELES


             POR LEONOR AMARANTE










             A NATUREZA DINÂMICA e fragmentária da arte   pública. “Percebi como a arquitetura está muito
             se abre a todo tipo de delírios e pode neutralizar   presente em meu trabalho e, quando coloquei esse
             simplificações e mesmices. A galeria Luisa Strina   pássaro agigantado, pensei mais como escultura
             dá um sopro poético no congestionado circuito de   e não como uma performance”. Laura imaginou
             arte deste mês com a mostra Você sonha com o   situação de cataclismo em relação ao povo, como
             quê?,  uma indagação de como a arrogância do   se colocasse um pássaro sobre um pequeno bon-
             mundo pode ser questionada com devaneios e   sai. “Pensei num pássaro caído no meio da cidade
             imaginação. A curadora mexicana Magali Arriola   e imediatamente elegi José Carlos Garcia, para
             monta um jogo a partir da obra A Flor Mohole, do   trabalhar comigo. Ele   faz esculturas com asas,
             filipino David Medalla e Espaços Virtuais do bra-  pássaros, é um grande escultor. Garcia diz que
             sileiro Cildo Meireles. No utópico Projeto Mohole,   esse projeto revela por onde o pássaro entrou,
             1957/1966, o artista imagina plantar uma flor no   onde ele bateu e morreu. Para ele, esse cenário
             centro da Terra para fazer ressurgi-la “com péta-  é uma grande paisagem que cada espectador vai
             las, rolando na crista de uma onda chegando à   fazer na sua cabeça. “Cada um aponta para um
             costa”, em diferentes formas e locais.  Já Espaços   lugar, para achar sua paisagem onírica”, comenta.
             Virtuais de Cildo, da década de 1960, questiona   Devaneios giram também em torno da obra do
             como nos aproximamos do espaço e de que como   colombiano Gabriel Sierra, que se vale de matéria
             a geometria pode modificar nossa relação com ele,   orgânica para reinventar planetas, um trabalho
             centrada na obra A Penteadeira, de 1967.    que funciona como um experimento. “Me interessa
              A coletiva utópica e orgânica que toca nos concei-  como vemos o espaço em que habitamos. Para
             tos de dentro/fora, cima e embaixo, reúne obras   expandir criatividade e ideias, as pessoas buscam
             de Marcel Duchamp, Pierre Huyghe, Laura Lima   mais espaço, como metáfora da suposta falta de
             e Zé Carlos Garcia, Marie Lund, David Medalla,   espaço, como se o planeta Terra fosse insuficiente
             Cildo Meireles, Theo Michael e Gabriel Sierra.   para a criatividade”. Com o curioso título CCCC
             O conjunto revela os limiares de percepção que   (chispa, corpo, casa, cosmo) ele faz uma alusão
             conectam luz e sombra, explora dramaticidade   ao espírito que habita esses territórios. Está em
             e poesia como a que se desprende de Pássaro,   jogo a liberdade de pensar sem fronteiras. “É uma
             2015/2018, escultura de Laura Lina e de José   forma de escapar do território que conhecemos
             Carlos Garcia.  No MMMMM... Manifesto, 1965,   na Terra”. De cada obsessão de Medalla e obser-
             Medalla sonha com esculturas que “migrem, em   vação de Cildo fica um trabalho, uma experiência,   FOTO EDOUARDFRAIPONT
             massa, para o Polo Norte”.  Laura Lima fala do   um modo de vivenciar o espaço. Seja real, onírico,
             Pássaro, inserida no desejo de fazer uma obra   distante ou profundo.


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