Page 69 - ARTE!Brasileiros #42
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MARTHA ARAÚJO, BRASIL, HÁBITO/HABITANTE (HABIT/INHABITANT), 1985
também na Pinacoteca (instituição que de longe abertura maior para outras formas de pensar e
realiza a programação mais feminista de 2018), produzir arte”, diz ela. Essa mudança decorre de
Rosana Paulino lembra que durante anos teve múltiplos fatores, como uma maior consciência
seu trabalho – baseado em experiências vividas política e social, o arrefecimento do formalismo
por ela e por grupos próximos, como as mulheres como caminho único e a internacionalização da
negras – mais reconhecido no exterior do que no produção. “Não dá mais para ignorar esta nova
País. Ela conta ter recebido vários convites para postura mundial, fingir que isto não existe, com o
estabelecer residência fora e que só ficou por risco de ficar preso no século XX quando o resto
teimosia. “Resolvi ficar porque achei que a cena do mundo já entrou no XXI”, constata.
brasileira necessitava de discussões como a que Esse descompasso histórico, a necessidade de
eu propunha. E confesso que não me arrependo dar continuidade a mobilizações iniciadas déca-
desta escolha. É muito bom, surpreendente até, das atrás, é algo também levantado por Josely
ver a produção que está vindo por aí. Achei que Carvalho, cuja exposição “Diário de Cheiros – Teto
não veria isto em vida. E é claro que isto reflete de Vidro” é um dos destaques da temporada no
em minha produção, quando opto por discutir MAC. A artista, que muda para os EUA após o
temas que a sociedade brasileira sempre varreu golpe militar e vive em Nova York desde a década
para debaixo do tapete, como as marcas deixadas de 1970, onde se engaja no movimento feminista
pela escravidão no país”, afirma. de arte contemporânea, se diz “assombrada por
A artista considera que essa maior abertura estarmos falando a mesma coisa do que nos
decorre do caráter urgente das questões com anos 1980”. Incomodada com o fato de ter sido
que trabalha e de uma maior liberdade de esco- longamente rotulada de “feminista” no Brasil,
lha do caminho a ser seguido. “Vivemos uma ela acredita que vivemos um momento propício
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Book_ARTE42.indb 69 3/22/18 6:10 PM