Arábia (2017), de Affonso Uchôa e João Dumans. Foto: Divulgação.
Arábia (2017), de Affonso Uchôa e João Dumans. Foto: Divulgação.

Até o dia 30 de abril é possível escolher entre 75 filmes (43 longas e 28 curtas) para assistir gratuitamente no site do Festival Cinema Brasileiro: Anos 2010, 10 olhares, que já está na sua terceira edição. Ele foi iniciado em 2001 (com retrospectiva referente ao cinema dos anos 1990) e seguiu em 2011 (com o cinema dos anos 2000). O projeto, idealizado pelo curador Eduardo Valente, busca resgatar parte significativa da filmografia nacional da última década, que contou com uma produção múltipla. Como o próprio nome indica, o festival é dividido em dez olhares de dez curadores diferentes. Confira abaixo a seleção de longas de cada um:

Cachoeira Doc: Desaguar em cinema: retomar territórios invadidos

“O movimento observado no traçado desenhado pelos filmes reunidos, nesse segmento, antes de divisor é desaguar: confluência contra fronteiras erguidas por invasões e expropriações – de terras, corpos, povos, vidas, imaginários –, fronteiras fincadas em nome de um Brasil por cima de todos. É, portanto, de um cinema contra a Nação, e não de um cinema nacional, que se trata aqui, por meio dessa pequena coleção de filmes documentais surgidos nesta última década, e reunidos por fluxos sutis de conexão. Se o documentário é o cinema que toma para si a tarefa de empurrar as fronteiras do visível, estes longas e curtas lançam-se nas geografias – do tempo e do espaço –, em operações de retomada: do próprio corpo e desejo, das cidades, das imagens, da história e da terra”.

 

Longas: 

Martírio, de Vincent Carelli
Retratos de identificação, de Anita Leandro
Ressurgentes: um filme de ação direta, de Dácia Ibiapina
A cidade é uma só, de Adirley Queirós.

Imagem do filme "Retratos de Identificação", de Anita Leandro. Foto: Divulgação.
Imagem do filme “Retratos de Identificação”, de Anita Leandro. Foto: Divulgação.
Carol Almeida: A cidade e as brechas ocupadas

“O cinema brasileiro produzido durante os anos 2010 esteve muito atento a questões sobre o direito à cidade, e fez esse debate se mover em imagem a partir de filmes muito distintos em suas propostas formais. Pensando mais especificamente sobre alguns corpos queer que se recusam de forma mais enfática a se adaptarem à arquitetura de segregação dos grandes projetos urbanos e quais espaços de existência que esses corpos conseguem criar, o recorte ‘A cidade e as brechas ocupadas’ agrega filmes que buscam, por um gesto de recusa, um modelo de vida de algumas cidades e simultaneamente de fabulação e criação de desejo dentro das rachaduras que surgem nos blocos de concreto”.

Longas:

Esse amor que nos consome, de Allan Ribeiro e Douglas Soares
Nova Dubai, de Gustavo Vinagre
Batguano, de Tavinho Teixeira
Temor Iê, de Elena Meirelles e Lívia de Paiva

Cleber Eduardo: Espaços concretos de vidas em cinema

“Esse segmento enfatiza uma linha de força de um grupo de filmes da última década e meia que conecta os modos de vidas de seus personagens com os espaços geográficos/sociais de suas vivências, amalgamando as vidas das pessoas fora da tela e das personagens na tela, sem deixar de haver jogo e criação para os filmes, reelaboração da vida cotidiana por dentro da vida em cinema, tensionando a autenticidade de corpos, espaços e falas com a elaboração cinematográfica, sem ter de firmar pacto com a ficção ou com o documentário, muito pelo contrário”.

Longas: 

A vizinhança do tigre, de Affonso Uchôa
Baronesa, de Juliana Antunes
Diz a ela que me viu chorar, de Maíra Bühler
Um filme de verão, de Jo Serfaty

Erly Vieira Jr: De corpo a corpo – personagens transbordantes, espectadorXs desejantes

“Esse conjunto de filmes explora algumas das diferentes estratégias de engajamento sensório que parte da produção LGBT+ brasileira da última década utiliza para falar diretamente aos corpos dos espectadores. Há desde a dimensão coreográfica/ performática presente na mise-en-scène, até o uso de uma visualidade ‘háptica’ (que remete ao tátil), promovida por uma câmera que muitas vezes funciona como um corpo que também é afetado por aquilo que registra. Também se pode incluir aqui o diálogo entre diversos gêneros audiovisuais e hibridismos com outras linguagens contemporâneas, bem como formas de se explorar as relações nem sempre conciliatórias entre corpos dissidentes em termos de gênero e sexualidade e os espaços que habitam”.

Longas: 

Corpo Elétrico, de Marcelo Caetano
Praia do Futuro, de Karim Aïnouz
As boas maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
Meu nome é Bagdá, de Caru Alves de Souza.

Still de "Praia do Futuro", de Karim Ainouz. Foto: Divulgação.
Still de “Praia do Futuro”, de Karim Ainouz. Foto: Divulgação.
Heitor Augusto: O corpo, novamente

“Reconhecendo o crescimento exponencial de realizadores e realizadoras não-brancas no cinema brasileiro ao longo da última década, esse recorte propõe uma costura na qual o corpo, particularmente o negro, é presença. Esse segmento reúne quatro filmes de realizadores negros, dois codirigidos por pessoas negras e um por um realizador não-branco. Além de trazer oito filmes para um lugar mais detalhado de apreciação, este recorte carrega também a intenção de que os filmes aqui exibidos facilitem a aproximação a muitos outros que porventura não integram este programa”.

Longas: 

Vamos fazer um brinde, de Sabrina Rosa e Cavi Borges
Baixo centro, de Ewerton Belico e Samuel Marotta
A batalha do passinho, de Emilio Domingos
Um filme de dança, de Carmen Luz

Janaína Oliveira: Cotidiano singular

“Na última década o cenário do cinema nacional presenciou a emergência de outros sujeitos na frente e atrás das telas contando suas histórias. Nesses deslocamentos de significados entre centros e margens que essa emergência propicia, vemos surgir obras que rompem com expectativas de representações já cristalizadas em nosso imaginário. Filmes com outros repertórios possíveis para o vivido todos os dias. O segmento traz um conjunto de filmes que dialogam com os cotidianos da vida naquilo que têm de único, mas afetivamente e efetivamente comum”.

Longas: 

Ela volta na quinta, de André Novais Oliveira
Café com canela, de Ary Rosa e Glenda Nicácio
Arábia, de Affonso Uchôa, João Dumans
Casa, de Letícia Simões

Kênia Freitas: Movimentos Fabulares 

“Esse segmento, apoia-se em dois aspectos basilares na sua proposição de olhar sobre os filmes da década de 2010. O primeiro é a ideia do movimento (dança/gesto/performance) como criador de fabulação nos filmes. O segundo aspecto é de pensar uma inflexão da década situada em 2015 (como um marco temporal simbólico): o movimento de um cinema (e recepção crítica) com linhas de força mais calcadas nas encenações realistas/naturalistas e perspectivas universais/totalizantes para um cinema mais aberto às possibilidades especulativas//experimentais e marcado muitas vezes pela auto-inscrição localizada”.

Longas: 

O que se move, de Caetano Gotardo
Brasil S/A, de Marcelo Pedroso
Yãmîyhex: As Mulheres-Espírito, de Sueli Maxakali e Isael Maxakali
Vaga Carne, de Grace Passô e Ricardo Alves Jr.

Leonardo Bonfim: Era uma vez, era outra vez…

“O foco principal aqui é pensar como um traço marcante do cinema contemporâneo – a ideia de que um filme pode recomeçar ao longo da projeção – foi abordado por longas brasileiros na última década. Dentro desse recorte, colocaremos em diálogo obras que se desdobram em duas ou mais partes, num jogo de variações e metamorfoses, e obras que aventuram a possibilidade da coexistência – nem sempre tranquila – de muitos filmes dentro de um mesmo filme”.

Longas: 

A cidade e os piratas, de Otto Guerra
Garoto, de Julio Bressane
Os dias com ele, de Maria Clara Escobar
António um dois três, de Leonardo Mouramateus
Luz nos trópicos, Paula Gaitán.

Still de "Os dias com ele", de Maria Clara Escobar. Foto: Divulgação.
Still de “Os dias com ele”, de Maria Clara Escobar. Foto: Divulgação.
Pedro Azevedo: O mundo em desencanto

“O critério inicial para definir esse recorte foi territorial. Trata de se mergulhar na produção nordestina e cearense da década de 2010, entendendo-a como uma parte bastante expressiva da cinematografia brasileira contemporânea, que vem ganhando cada vez mais espaço de exibição e debate no circuito de festivais nacionais e internacionais, além de infiltrar-se progressivamente no circuito exibidor de salas comerciais. Não se trata, contudo, de reafirmar a força do cinema produzido no nordeste como um gesto esvaziado de sentido, fadado à esterilidade da boa intenção, mas de propor uma via livre de acesso a filmes  de artistas nordestinos que, quando pensados, exibidos, assistidos em conjunto, possam traduzir uma série de ideias complexas sobre questões que atravessam e transcendem a experiência de ser nordestino num Brasil cujas fronteiras apontam para a formação de um estado-nação que se desenha como ficção pura”.

Longas: 

Medo do escuro, de Ivo Lopes Araújo
Inferninho, de Guto Parente e Pedro Diógenes
A seita, André Antônio
Sol alegria, Tavinho Teixeira, Mariah Teixeira
Canto dos Ossos, de Jorge Polo e Petrus de Bairros

Rafael Parrode: Desvios do contemporâneo

“Ao nos locomovemos por destroços e ruínas de um passado recente, é preciso também partir de uma autocrítica, buscando compreender em que medida o cinema brasileiro se adequou a estilos, modelos de produção e difusão, e até que ponto vínculo permanecerá de pé diante do caos que se afirma. Nessa perspectiva, em que medida seremos reféns ao invés de operadores de novas estéticas emergentes, desvinculadas de um desejo de adequação do cinema brasileiro? A década passada viu muitos filmes que moldavam-se a um padrão internacional. São filmes facilmente encaixáveis em chaves ou tendências totalizantes do cinema mundial. Não se trata aqui da imposição de uma ideia de ‘novidade’, mas de tensionar as novas formas a partir deste arcabouço histórico. Investigar essas formas do cinema que agora já pertence ao passado é também um meio de compreender as amarras e enfrentamentos que precisamos lidar hoje”.

Longas: 

Já visto, jamais visto, de Andrea Tonacci
Tava, a casa de pedra, de Vicent Carelli, Patricia Ferrreira (Keretxu), Ariel Duarte Ortega, Ernesto Ignacio de Carvalho
Vermelha, de Getúlio Ribeiro
Guerra do Paraguay, de Luiz Rosemberg Filho
Filme de aborto, de Lincoln Péricles.

Entre neste link para assistir.

LEIA MAIS: A Última Floresta, documentário escrito por Luiz Bolognesi e pelo líder indígena Davi Kopenawa, vai além do puro retrato etnográfico tentando incorporar a poética dos Yanomami. Filme foi responsável por encerrar o Festival É Tudo Verdade deste ano e estreará em breve no Brasil.


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