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EXPOSIÇÕES SÃO PAULO
NA MODESTA ENTRADA DA RUA ÁLVARO DE a Era Vargas, presidente homenageado com busto
CARVALHO, 427, no centro de São Paulo, é dona na entrada, que desapareceu ao longo da histó-
Irene Silva quem faz as honras da casa. Moradora ria recente. Desde 1997, ocupações passaram a
de lá, é ela quem cuida da entrada, durante o dia, ocorrer ali, depois de 20 anos de abandono, e a
por onde cerca de 500 moradores de 120 famílias atual, organizada pelo MSTC, teve início em 2016.
passam diariamente para entrar na Ocupação 9 Nela, artistas vêm colaborando de forma orgânica
de Julho, gerida pelo Movimento Sem Teto do desde o início. O Aparelhamento, por exemplo, que
Centro (MSTC). surgiu em 2016, quando a Funarte começou a ser
Além da entrada, dona Irene também cuida do desativada pelo governo Temer, ajudou a organi-
jardim e da horta da ocupação, “mãos ótimas zar a cozinha comunitária, que prepara almoços
que quando plantam tudo dá”, como escreveu o festivos uma vez por mês, e tem sido importante
artista Lourival Cuquinha, ao responder minha para a manutenção das condições do edifício.
mensagem solicitando o nome dela. Na galeria, quem fala das obras é Felipe Figueiredo,
É dona Irene, com sorriso no rosto, que indica monitor e ativista que vive na Ocupação desde
como chegar na galeria Reocupa, onde ocorre seus primeiros momentos, em 2016, e que sabe
a mostra O Que Não é Floresta é Prisão Política, não só de cada trabalho, mas da própria história
com cerca de cem artistas, entre eles o próprio do movimento. Ele desenvolve sua narrativa con-
Cuquina. Arte no vão central de um espaço de tando desde a importância de levar colchões nas
resistência. Eu me senti em Bacurau. primeiras horas de uma ocupação a estimular o
A mostra, em cartaz de quarta a domingo, das 14h visitante a ouvir Serenata de Amor, de Georgia
às 20h, ocorre desde setembro com 74 artistas, Miessa, uma compilação de canções machistas
sendo que outros 15 foram agregados em outubro e, na música popular brasileira, desde 1920.
agora em novembro, outro grupo será adicionado. Vivendo na Ocupação, Felipe garante um vín-
Não se sabe exatamente até quando a mostra per- culo estreito entre produção artística e seu con-
manece, mas é seguro que segue até o fim do ano. texto. Não que os trabalhos sejam colocados ali
Artista é o termo adequado para denominar quem alheios ao espaço, como se ele fosse um cubo
dela participa, mesmo que nem todos ali têm na branco. Longe disso. Mas é justamente esse cará-
arte sua principal atividade. Há desde figuras ter vital desencadeado pela ocupação que dá
reconhecidas internacionalmente no circuito da particularidade e relevância, e a voz de Felipe
arte, como Ernesto Neto e Renata Lucas, em meio é essencial. Mas entrar na Reocupa é também
a outros que vivem e produzem na própria Ocu- sentir o cheiro das comidas sendo preparadas
pação, enquanto outros se destacam em áreas nos andares acima, dos produtos de limpeza em
próximas, como a fotojornalista Marlene Bergamo uso, é ouvir as crianças brincando, é ver o tempo
ou o filósofo Peter Pál Pelbart. No entanto, ali desgastando um edifício que já foi público e se
é o lugar mais adequado para por em prática a encontrava abandonado. Tudo muito distante
famosa expressão de Joseph Beuys, que “todo dos espaços tradicionais e higienizados da arte.
ser humano é um artista”. Tudo muito mais potente.
Apesar dos 89 nomes indicados nos mapas que Não só o ambiente é libertário, como as próprias
indicam a disposição das obras na mostra, ao estratégias de curadoria, a começar pela seleção
menos outras duas dezenas também participam do nome da mostra. Quando desce do primeiro
com intervenções ao longo de outros oito anda- andar para a Reocupa, pode-se ler a troca de
res da ocupação – a galeria Reocupa é de fato mensagens no grupo de artistas que participam
no térreo do edifício, onde está a entrada para a da mostra para a escolha do nome. “É a nossa
avenida 9 de julho, que não se encontra em uso, vaza-jato”, explica Cuquinha, ao descrever o pro-
e todo seu entorno. cesso de transparência assumido, mesmo que
Com 14 andares, o prédio foi construído como os nomes estejam apagados. O importante é o
sede do INSS em São Paulo, inaugurado em 1943. processo, afinal.
Projetado por Jayme Fonseca Rodrigues, o edifício A maioria dos artistas ali presentes tem colabo-
é um dos ícones da arquitetura paulistana durante rado na ocupação de forma atuante e sistemática,
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