Page 88 - ARTE!Brasileiros #48
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CRÍTICA CCBB






            VAIVÉM TRATA DA

            CULTURA BRASILEIRA

            PARA ALÉM DA ARTES

             Exposição com
             curadoria de Raphael
             Fonseca aborda a rede

             de dormir sob múltiplas
             perspectivas no CCBB



             POR FABIO CYPRIANO

                                                                                      VISTA DA EXPOSIÇÃO, VAIVÉM, 2019







             “NÃO CABE MAIS VER AS REDES COMO ESPAÇO DE       Vem deles, aliás, algumas das imagens mais potentes da
             DESCANSO E DECORAÇÃO. Necessita-se admirar sua   mostra, grande parte delas comissionadas pelo curador,
             representação e compreender que materialidade é a prova   entre elas produzidas por Yermollay Caripoune, Alzelina
             da resistência ameríndia. Que por trás da beleza e da forma   Luiza, Carmézia Emiliano e Jaider Esbell, entre outros. No
             existem focos de resistência. Que tecer ou criar a partir delas   catálogo, Clarissa Diniz cita uma fala de Esbell, aliás, que
             é arte, ativismo. É atividade. É sobrevivência. É ser.”, afirma   aponta de maneira exata porque a mostra alcança alta
             Naine Terena no catálogo da mostra Vai e Vem, vista até julho   voltagem política: “Não há como discutir descolonização
             no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo e, agora em   sem adentrar as portas das cosmovisões dos povos
             setembro, sendo  aberta em sua sede de Brasília, seguindo   originários”.
             depois para o Rio e Belo Horizonte.              Há aí um acerto curatorial imenso, afinal, mesmo que
             Vai e vem é dessas mostras que vão além do campo da arte   artistas contemporâneos tenham se apropriada da rede em
             para tratar da cultura de forma mais ampla, e aí está seu   suas obras, de Hélio Oiticica a Tunga, de Paulo Nazareth
             maior valor.                                     a OPAVIVARÁ – todos presentes na mostra, é no contexto
             Mais do que simplesmente apresentar de forma sequencial   indígena que ela ganha caráter de resistência e manifesto
             várias representações de um dos mais típicos objetos da   anti-hegemônico.
             cultura brasileira, a exposição com curadoria de Raphael   A exposição ainda é generosa ao apresentar as diversas
             Fonseca apresenta diversos aspectos dos significados da   representações da rede ao longo dos séculos, seja nos
             rede, como aponta Naine na citação acima, indo muito além   artistas viajantes da época da monarquia do Brasil, seja por
             do clichê da preguiça que o colonialismo a demarcou.  sua revisão crítica, tão bem realizada por Denilson Baniwa.
             Isso fica claro logo na primeira sala da mostra, quando se   A exposição é sem dúvida audaciosa, ao apresentar mais de
             contextualiza a importância da produção do artefato de   300 obras de 140 artistas, em um período de cinco séculos,
             origem indígena no nordeste, mais especificamente em São   do 16 ao presente. Contudo, seu foco é preciso, e passar por
             Bento, na Paraíba, onde são produzidas por ano nada menos   ela uma experiência efetiva.
             que 12 milhões de redes. Os números aí já deixam claro que   É essencial lembrar que a mostra é fruto de um doutorado
             o impacto do comércio vai também além do estereótipo que   realizado pelo curador ao longo de cinco anos, portanto
             se pode ter. O portal da cidade possui um imensa rede para   uma pesquisa de fôlego, que se materializa no espaço
             marcar posição.                                  expositivo de forma adequada e realmente como uma
             Assim, a mostra segue em uma sucessão de narrativas um   vivência, isso é, não se trata de uma transposição ilustrativa
             tanto surpreendentes ao longo de seis módulos, que abordam   de uma tese. Em tempos de questionamento da ciência e
             desde as distintas formas de representação da rede, seja no   da academia, Vai e vem serve ainda para apontar como o
             modernismo brasileiro, seja nos quadrinhos de Walt Disney com   ambiente universitário segue essencial para a reflexão da   FOTO EDSON KUMASAKA
             o Zé Carioca, até sua função de geradora de identidade, como   cultura brasileira, assim como capaz de transpor o ambiente
             bem aponta Naine Terena em relação aos povos indígenas.  acadêmico para um diálogo potente com a sociedade.








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