Page 42 - ARTE!Brasileiros #42
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EXPOSIÇÃO SÃO PAULO






                                  EM NOME DAQUELES


                                  QUE VIERAM ANTES





                                  A PRESENÇA DA ANCESTRALIDADE NO LEGADO DE MESTRE DIDI VAI ALÉM DA RELIGIÃO,
                                  SE COMPORTANDO COMO UM ATO POLÍTICO DO ARTISTA EM FAVOR DE SEUS IGUAIS


                                  POR JAMYLE RKAIN




                                 EM 2017, foi comemorado o centenário de   um projeto para crianças até 14 anos para
                                 Mestre Didi, como era chamado o sotero-  que aprendessem sobre seus ancestrais por
                                 politano Deoscóredes Maximiliano dos    meio de contos e da tradição oral”, comenta.
                                 Santos. Artista plástico, escritor e sacer-  Essa iniciativa remonta à vida do próprio Didi,
                                 dote, recebeu diversas homenagens no    tendo em vista que cresceu no Ilê Axé Opó
                                 estado onde nasceu. Agora, é a vez da   Afonjá, onde aprendeu sobre suas raízes nas
                                 trajetória de Didi ser celebrada pela Galeria  histórias que eram contadas principalmente
                                 Almeida e Dale, em São Paulo, com a expo-  por Mãe Anininha, a qual considerava uma
                                 sição Mo Ki Gbogbo In – Eu saúdo a todos  avó, e Mãe Senhora, sua mãe biológica. Para
                                 que tem abertura no dia 7 de abril.     o pesquisador, esse era um ato político do
                                 Para compreender a arte de Mestre Didi, é   artista, que “não participava de movimentos,
                                 preciso entender a forte ligação dele com a   mas movimentava sua própria comunidade”.
                                 ancestralidade. Filho de uma ialorixá com   Com sua mulher, Juana Elbein dos Santos,
                                 muita influência na introdução do Candomblé   e do fotógrafo Pierre Verger, que tem foto-
                                 no País, o artista dedicou sua vida a preser-  grafias na mostra (assim como Mário Cravo
                                 var a memória de seus ancestrais africanos   Neto), Mestre Didi foi à Nigéria e à República
                                 e afro-brasileiros por meio das narrativas   do Benin em 1967. Patrocinada pela UNESCO,
                                 visuais, escritas e orais que produziu.   iriam fazer uma comparação entre a arte
                                 Para Antônio Marcos dos Santos Cajé, mestre   sacra produzida no Brasil e na África Ociden
                                                                                                             -
                                 em História da África, da Diáspora e dos Povos   tal. “Foi uma viagem na qual ele foi buscar
                                 Indígenas pela Universidade do Recôncavo   suas raízes. Por isso, foi a partir dela que
                                                                     -
                                 Baiano e amigo do artista, a questão da ances  ele começou a compreender muito melhor
                                 tralidade em Mestre Didi não pode ser vista   as suas origens”, declara Antônio Marcos.
                                      apenas sob o olhar religioso: “Quando   As obras presentes na exposição Mo Ki Gbo-
                                      falamos de ancestralidade, falamos de   gbo In datam majoritariamente de um período
                                      cultura no geral. Ela tem um papel cen -  posterior à essa descoberta feita por Didi.
                                 tral na religião, mas não só. Fala-se em nome  Desta forma, é possível visualizar com muito
           MESTRE DIDI,
         OPÁ EXIM ATI EJÓ        de um conjunto maior”, afirma.           mais afinco esse encontro de Didi com o que
         MEJI, CETRO COM
           LANÇA E DUAS          O artista tinha uma enorme preocupação   seria sua identidade. São 48 esculturas do
            SERPENTES
            CETRO COM            com a identidade da população negra. Acre-  artista exibidas pela Almeida e Dale, em par-
           LANÇA E DUAS
            SERPENTES,           ditava que, por meio do reconhecimento das   ceria com a Paulo Darzé Galeria, de Salvador.
           NERVURA DE
            PALMEIRA,            histórias passadas, era possível fortalecer   Além delas, são expostos ibirís e xaxarás ori-
          COURO PINTADO,
         BÚZIOS E CONTAS         a luta contra o racismo. “Mestre Didi criou   ginais e depoimentos de Mestre Didi.
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