Page 12 - ARTE!Brasileiros #47
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“A GENTE COMBINAMOS

             DE NÃO MORRER”, 2019

             POR PATRICIA ROUSSEAUX, DIRETORA EDITORIAL















               O TÍTULO DO NOSSO EDITORIAL vem emprestado    A arte costuma cumprir seu papel, uma espécie de
             do nome da obra de Jota Mombaça, cujos detalhes   espelho e de alerta permanente sobre tudo que nos
             publicamos na capa desta edição. O trabalho foi rea-  rodeia. Cildo Meireles, um dos maiores artistas contem-
             lizado em colaboração com Musa Michelle Mattiuzzi,   porâneos brasileiros já disse: “Não se faz um trabalho
             Cíntia Guedes, Ana Giza, Adrielle Rezende, Juão Nin   político em arte. Ele se torna político”.
             e Paulet Lindacelva, e forma parte de uma sequência   Em contrapartida à institucionalização da barbárie, uma
             de performances na Casa do Povo em São Paulo. A   espécie de ode à morte que torna o dia obscuro, nós
             ação consistiu dentre outras coisas em manufaturar   aderimos à vida e à arte, e a usamos como símbolo de
             facas com barbantes, galhos e vidros hoje expostos no   potência e da força com que a pulsão de vida e de morte
             SESC 24 de Maio na mostra À Nordeste, comentada   aparece nela... “Trata-se de uma morte-vida. Sempre
             nesta edição pela jornalista Jamyle Rkian e criticada   que um artista proclama a morte da arte, novo salto é
             pela historiadora e curadora Aracy Amaral.      dado, e a arte acumula forças para uma nova etapa.”
             É notória a presença ou a alusão à violência em varias   Dizia Frederico de Morais em Contra a arte afluente. O
             das entrevistas ou exposições que acompanhamos   corpo é o motor da obra, 1970.
             nos últimos tempos. Nas obras é latente a iminência
             de perigo, a sensação de desamparo, a necessidade   No mês de maio o Instituto Tomie Ohtake, por meio
             de encontrar respostas e resistir, encontrar formas de   de seu núcleo de Cultura e Participação em parceria
             cura para o sujeito e o ambiente.  Estamos perpassados   com o filósofo, ensaísta e tradutor Peter Pál Pelbart
             por um momento de enorme violência. A violência de   convidou um dos mais atuantes pensadores da atuali-
             uma sociedade que agride o não igual; de cidadãos e   dade, o filósofo francês e professor da Sorbonne (Paris
             políticos que defendem colocar armas a disposição   I) David Lapoujade. Ao longo de quase duas horas ele
             de uma população cujas dificuldades e intolerância só   discorreu sobre um texto intitulado “A Força da arte”
             aumentam. A violência de ter que mendigar educação,   apresentando ideias de Nietzsche e de Deleuze que
             trabalho, saúde e assistir a cada vez maior precariza-  refletem sobre o quanto a arte nos proporciona uma
             ção da qualidade de vida. A violência da pós-verdade   “promessa”, “uma crença neste mundo aqui”, não uma
             e da pós-mentira.                               crença teológica, já que não deveríamos acreditar em
             A violência de não se fazer nada para impedir a vio-  nada quando estamos com a obra e, ao finalizar disse:
             lência. A artista paraense Berna Reale, no seu vídeo   “Ou seja, a força da arte - quando ela a tem - é poder
             Americano, 2013 e a artista Cinthia Marcelle, no Chão   se auto justificar (e nos justificar) melhor que qualquer
             de Caça, 2017 apresentaram no Pavilhão Brasileiro nas   outra forma de realidade, poder adquirir, exclusivamente
             Bienais de Veneza de 2015 e 2017, respectivamente,   por sua força, uma razão de existir e de nos fazer existir.
             obras de denúncia às condições de indigência e de   Se tivesse de resumir numa palavra (para concluir) em
             superpopulação carcerária no país. Elas antecipavam,   que consiste a força da arte, diria, portanto, que essa
             com suas imagens, diversas rebeliões e a carnificina   palavra é: justiça.
             que implodiu nestes dias nos cárceres de Manaus,   *Lapoujade tem seus livros publicados no Brasil pela n-1 edições: Potências do
             deixando dezenas de mortos. Quase numa alegoria   tempo; Deleuze, os movimentos aberrantes; A construção da experiência e As
             ao livro Crônica de uma morte anunciada do escritor   existências mínimas. No prelo Ficções do pragmatismo, sobre os irmãos James –
             colombiano Gabriel Garcia Marquez.              o filósofo e o romancista, “A força da arte”.







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