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EPISÓDIOS DO SUL JOANESBURGO
SEMPRE EM MOVIMENTO
NOVOS CAMPOS DE ATUAÇÃO DE MUSEUS ENTRAM NA PAUTA DE PROJETO DO INSTITUTO
GOETHE DE SÃO PAULO, EM ENCONTRO REALIZADO NA ÁFRICA DO SUL
POR FABIO CYPRIANO
“SOU VENEZUELANA, vivo em Medellín, então mundo, como se os milhares de africanos da tribo
achei que entendia de complexidade, mas vejo que zulu nada significassem. “Como assim?”, reagiu
aqui a situação é muito mais complexa”, disse, em prontamente alguém do grupo. “Eu quero dizer:
tom de espanto, Nydia Gutierrez, curadora-chefe alguém que não fosse nômade”, respondeu, sem
do Museu de Antioquia, na Colômbia. No fim de dar muita importância à pergunta. A partir daí, por
janeiro passado, por quatro dias, ela e outros 15 20 minutos, ele falou sem parar, explicando toda
curadores e diretores de museus participaram do uma versão da história da África do Sul recheada
Episódio Museal, uma imersão em 13 instituições de preconceitos e que culmina no dia 16 de dezem
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culturais de Joanesburgo e da Cidade do Cabo, bro de 1838 com a Batalha do Rio de Sangue,
na África do Sul. quando 464 pioneiros venceram mais de dez mil
O programa foi tão intenso que muitos debates zulus. Por causa dessa data, até 1994, em 16 de
ocorriam no ônibus que transportava o grupo de dezembro comemorava-se o feriado do Dia do
um local para outro. Foi lá, aliás, que Gutierrez Juramento – já que os “pioneiros” prometeram a
fez a constatação, com a qual possivelmente a Deus que construiriam uma igreja se vencessem
maioria concordou. Era o terceiro dia de viagem a batalha. Com o fim do regime do Apartheid
e, na mesma manhã, o grupo visitara duas institui- (1948-1994), o feriado foi renomeado para Dia
ções em Pretória: o Monumento Voortrekker (dos da Reconciliação.
pioneiros) e, logo depois, o Parque da Liberdade O choque, contudo, não veio apenas da existência
(Freedom Park). “Não tenho o que dizer, estou de um “monumento ao invasor”, mas do contraste
chocado”, comentou no debate, com o ônibus em dele com o Parque da Liberdade, apenas algumas
movimento, o curador brasileiro Marcelo Rezende. centenas de metros dali. “Ele foi construído exa-
Todos estavam de fato chocados. O tal monumento tamente para ser uma oposição clara ao monu-
dos pioneiros, uma edificação fálica de granito mento dos pioneiros”, explicou, ainda no ônibus,
cinza com 40 metros de altura e que levou 12 a escritora sul-africana Tracy Murinik, encarre-
anos para ser construído (1937-1949), foi criado gada de mediar a visita do grupo ao seu país e
para celebrar, basicamente, a vitória do invasor que também tinha a função de contextualizar e
branco sobre o império zulu. A narrativa é clara motivar os diretores e curadores a discutirem o
no friso com 27 baixos-relevos que circunda o que tinham visto.
monumento por dentro e foi contada por um guia Inaugurado em 2004, dez anos após o fim do
branco. “Antes de chegarmos, não havia nada Apartheid, o parque se constitui de fato como
aqui”, disse o senhor com a voz mais natural do uma antinarrativa ao monumento dos pioneiros,
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Book_ARTE_38_POR.indb 20 3/3/17 9:47 PM