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nesta edição, mergulhamos num manancial de iniciativas de instituições culturais de
São Paulo, do Norte e do Nordeste do Brasil que estão interessadas em revelar parte do
apagamento de nossa história, parte do apagamento pós-colonial. A exemplo das expo-
sições Ensaios para o Museu das Origens, montada no Tomie Ohtake e no Itaú Cultural
e Histórias Indígenas, no MASP; da mostra com as recentes aquisições para a coleção o
Banco do Nordeste, em Recife (PE); da Bienal das Amazônias, em Belém do Pará, e do per-
curso do Manto Tupinambá, apresentado por Célia Tupinambá. Entrevistamos curadores,
por patricia rousseaux, diretora editorial BEBENDO DA FONTE
pensadores, arqueólogos e artistas de várias regiões do país. Ouvimos falar da necessidade
de mudanças radicais nos museus e do quanto seria necessário ouvir a natureza. Num
país que foi e é indígena, caboclo, ribeirinho, afro-descendente e branco. Num país cuja
pluralidade tem início há mais de 6.000 anos, e não como é tradicionalmente entendido,
num país que nasceu em 1500.
Nesse percurso de quase dois meses conferimos o quanto nossa visão de interdisci-
plinariedade é fundamental para analisar praticamente todos os fenômenos que se rela-
cionam com o indivíduo e, por tanto, o impacto que eles têm na arte. Isso já foi abordado
profundamente por arte!brasileiros, no seu VI Seminário: Em defesa da Cultura e da
Natureza, ainda na pandemia, e nossa experiência frente ao colapso já trazia a necessidade
de se “pensar em volta”.
Claro que muitas dessas conclusões são óbvias para os antropólogos ou historiadores, os
estudantes de história da arte ou filósofos, mas definitivamente não são óbvias para muitos.
Sempre desenvolvemos tecnologias: está aí a reportagem no Museu de Arqueologia
Emílio Goeldi, de Belém de Pará, mostrando técnicas ancestrais de comunicação, torração
e agricultura. A questão é: nós a colocamos a serviço de quê?
Ainda hoje currículos nacionais não levam em consideração saberes regionais e estudos,
que já vêm sendo feitos respeitando linguagens, sabedorias, crenças, pesquisas realizadas
por universidades nacionais, com profissionais capacitadíssimos. O fato de se ter declarado
a independência dos colonizadores não extirpou uma construção intelectual voltada para
fora. A Amazônia está mais perto da história dos países andinos, de suas sabedorias e
descobertas ancestrais, do que da europeia, por exemplo. Não obstante, sua construção
pós-colonial a levou a olhar por cima do Brasil e do Oceano Atlântico, para a Europa ou
ainda para os países do Norte.
As elites latino-americanas cresceram com o capital financeiro, pouco preparadas ou
preparadas para uma visão individualista de construção da sociedade. Com o auge do
neo-liberalismo, a partir dos anos 1980, a sociedade como um todo foi se afastando cada
vez mais da tentativa de entender quem somos, onde habitamos, e a floresta ficou cada
vez mais longe e os nossos “sintomas sociais” só pioraram. Recomendamos a leitura do
capítulo Diagnóstico da Modernidade e Perspectivismo Ameríndio, (Mal-estar, sofrimento
e sintoma, Christian I. L. Dunker, pag. 273, Editora Boitempo)
Estamos avançando. A mais recente Bienal de São Paulo foi uma excelente surpresa,
fazendo associações entre passado e presente, trazendo questionamentos e uma estética
cuidadosa. Vamos colocando luz onde podemos. A volta dos investimentos em cultura vai
servir para isso, mas é necessário não perder de vista a necessidade da crítica e o quanto,
muitas vezes, lutas anti-hegemônicas servem apenas para serem capturadas por cam-
panhas de marketing, ao invés de se tornarem o devido caminho para construir saberes
formativos e coletivos.
Boa leitura, bom 2024, com saúde, força e alegria. FOTOS: PATRICIA ROUSSEAUX
OBS.: Recomendamos “bubuiar” nas férias!!!
(leia entrevista completa com o Professor Paes Loureiro na pág. 36)