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EXPOSIÇÃO SÃO PAULO






            transformação, fomentando a percepção dos processos
            de apagamento e dominação, que não se restringem
            somente a uma etnia, um gênero ou qualquer outro
            critério e sim a uma lógica de classes. Izabela Pucu, que
            também coordena a Plataforma Mario Pedrosa, sintetiza:
           “Ao colocar, lado a lado, as manifestações culturais dos
            consagrados e dos excluídos, o popular e o erudito, sem
            hierarquias, preservando suas diferenças e conflitos em
            convívio, a proposta expôs a complexidade de nossa
            origem, marcada pelos processos colonizatórios do
            passado e de hoje.”
               Assim, as propostas de Pedrosa continuam a rever-
            berar e, apesar de não terem sido adotadas na prática,
            ainda podem ser consideradas um farol, capaz de orien-
            tar um movimento de resgate e luta pela transformação
            cultural e política – dois elementos indissociáveis em
            seu pensamento e sua ação –, mas também um potente
            instrumento crítico em relação ao atual status quo do
            sistema da arte, cada vez mais excludente e submetido
            ao peso das instituições e do mercado.
               A interação entre os agentes também é fundamental
            na tentativa de instituir um processo de reconfiguração
            e espraiamento de novas formas de trabalhar acervo,
            memória e uma concepção mais alargada e inclusiva
            e generosa de arte. O número de participantes tam-
            bém foi determinado pelas condições objetivas. Afinal,
            como lembra Miyada, se houvesse mais tempo ou mais
            espaço, as configurações da mostra seriam totalmente
            diferentes. Ou, como diz Sofia Fan, gerente do Núcleo
            de Artes Visuais e Acervos do Itaú Cultural, “sabemos
            que tocamos apenas a ponta do iceberg”.
               Ensaios tem por princípio fundamental o trabalho
            realizado a muitas mãos. Junto com a equipe curatorial
            geral, a estrutura de cada uma dessas organizações foi
            convocada a estabelecer a forma de contar suas histórias
            invariavelmente marcadas por desafios e superação de
            obstáculos. O conjunto parece, assim, desdobrar-se
            em núcleos menores autônomos e ao mesmo tempo
            conectados. Resgatam, aqui e ali, a importância de
            outras figuras e outros interlocutores fundamentais
            para o pensamento da cultura brasileira a partir do
            século xx, como Emilio Goeldi, Mário de Andrade, Darcy
            Ribeiro e Lina Bo Bardi. Para além desses nomes mais
            conhecidos, outros estudiosos, pensadores e militantes
            também foram rememorados, como Guilherme Tiburtius,
            que fez um trabalho silencioso e precioso de estudo,
            preservação e catalogação dos sambaquis. O volume
            de textos, documentos, cartas, fotografias e material

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