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i seminário latino-americano: relatos, memó- e Teoria das Artes na Faculdade de Filosofía y Letras da
ria e reparação. Vivenciamos, de 15 anos para cá, Universidade de Buenos Aires. A antropóloga feminista
uma importante mobilização pública, internacional, em Rita Laura Segato, escritora argentina residente entre
defesa de lutas anti-hegemônicas, para a conscientização Brasília, Tilcara e Buenos Aires, especialmente reconhe-
e profunda compreensão da existência de um racismo cida por suas investigações, junto aos povos indígenas e
estrutural e a necessidade de sua definitiva abolição; para às comunidades latino-americanas, sobre violência de
a defesa e o respeito à escolha ou mudança de gênero; a gênero, racismo e colonialidade. Ana Gonçalves Magalhães,
defesa do reconhecimento dos povos originários, aqueles historiadora da arte, Professora Livre-docente, curadora
que, no caso da maioria dos países colonizados foram e, atualmente, diretora do Museu de Arte Contemporânea
por patricia rousseaux, diretora editorial CARTA DA EDITORA
usurpados de suas terras, culturas e religião. É fato que da Universidade de São Paulo (MAC USP, 2020-2024). Ana
este movimento obrigou a que governos e instituições Maria foi coordenadora editorial e assistente curatorial
de países colonizadores começassem a se reposicionar da Fundação Bienal de São Paulo entre 2001 e 2008.
sobre os espólios retirados de suas ex-colônias. Inúmero/ Nicolas Soares, artista, pesquisador, curador e gestor
as pesquisadores, como Anne Lafont, Bénédicte Savoy e, cultural formado pela Escola de Belas Artes da UFBA, em
Felwine Sarr estudaram especialmente o perverso apaga- Salvador, e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em
mento de mulheres e homens negros em obras exibidas Artes da UFES, em Vitória, Espíritu Santo. Coordenador
em museus europeus e americanos, assim como lançaram da Galeria Homero Massena da Secretaria de Cultura
luz sobre a necessidade de devolver obras usurpadas ao (SECULT- ES). Aline Motta, artista brasileira que nasceu
longo de anos aos países de origem, com o propósito de em Niterói (RJ) e combina diferentes técnicas e práticas
rever políticas de relacionamento e ética internacional. A artísticas em seu trabalho, como fotografia, vídeo, instala-
maioria das matérias e dos artigos desta edição reflete ção, performance e colagem. De modo crítico, suas obras
o impacto deste debate e a importância que alcançou. reconfiguram memórias, em especial as afro-atlânticas,
arte!brasileiros acompanha, desde seu lugar de atuação, e constroem novas narrativas que invocam uma ideia
de forma genuína, todo este movimento, e vem realizando não linear do tempo. O coletivo de investigação e produ-
uma serie de encontros internacionais. Dentre os mais ção artística Declinación Magnética (Aimar Arriola, Jose
recentes, aquele organizado em 2021, o VI Seminário; Em Manuel Bueso, Diego del Pozo, Eduardo Galvagni, Sally
Defesa da Cultura e da Natureza, em parceria com o Goethe Gutiérrez, Julia Morandeira e Silvia Zayas), fundado em
Institut, e, no ano passado, o VII Seminário Internacional: 2013, na Espanha, formado por artistas visuais, teóricos e
Cultura, Democracia e Reparação, junto ao Sesc SP. curadores cujo trabalho partem da tomada de consciência
Aprofundano-nos no debate, lançamos agora o I Semi- dos estudos pós-coloniais e decoloniais. O italiano Euge-
nário Latino-americano: Relatos, memória e reparação, que nio Viola, curador-chefe do Museo de Arte Moderno de
tem por objetivo dar início a uma efetiva troca de reflexões Bogotá (MAMBO). Florencia Battiti, curadora, crítica de
sobre a nossa história colonial como continente e que arte e docente de arte contemporânea. Diretora executiva
pretende debater o impacto que essas novas narrativas do Parque de la Memoria, Florencia obteve, em 2013, a
contra-hegemônicas têm tido no sistema da cultura e da bolsa Trabucco com um projeto de investigação sobre a
arte contemporânea em diferentes partes do mundo e, irrupção da memória política na arte argentina durante os
mais especificamente, na América Latina. anos 1990. Por último, para debater o cruzamento entre
Desta vez em parceria com BIENALSUR23, a Bienal a filosofia e a tecnologia, Tomás Balmaceda, doutor em
Internacional de Arte Contemporânea do Sul, nascida na filosofia e professor na UBA y UdeSA, fundador e integrante
cidade de Buenos Aires, Argentina, que em sua quarta do GIFT (Grupo de Inteligencia Artificial, Filosofía y Tec-
edição inaugura várias mostras em diferentes cidades nología), parte de IIF/SADAF CONICET. E o psicanalista
do país, a arte!brasileiros abre mais um espaço na busca e professor da USP Christian Dunker.
por diluir fronteiras, e se junta, com parte da sua equipe, a O Seminário será transmitido via streaming pelos
renomados curadores, acadêmicos, artistas, historiadores websites institucionais da BIENALSUR e da arte!brasi-
e profissionais da cultura, de diferentes partes da América leiros, com tradução simultânea (espanhol-português,
Latina e da Europa para apresentar, durante os dias 3 e 4 português-espanhol). O encontro será gravado na íntegra
de agosto de 2023, entre as 18h e 21h, em quatro mesas, e posteriormente editado para a sua livre reprodução em
questões sobre democracia e reparação, a decolonização canais e instituições parceiros e apoiadores.
na prática, o lugar do relato, da memória, as narrativas, Nesta 63ª edição, a revista estabelece alguns diálogos
a ficção e o real. com o I Seminário Latino-americano: Relatos, memória
O encontro, que se realizará no Auditorio Sede Recto- e reparação por meio de alguns de seus textos, a exemplo
rado Juncal de la Universidad Nacional de Tres de Febrero do artigo Concreto, em que Nicolas Soares discorre sobre
(UNTREF), Juncal 1319, Ciudad de Buenos Aires, Argenti- a reestruturação sociocultural que vem ocorrendo sobretudo
na, receberá a catedrática de História da Arte Moderna e na arte; na reportagem sobre a exposição de Sheroanawe
Contemporânea, da Universidad Complutense de Madrid, Hakihiiwe, um artista ianomâmi que faz uma espécie de
e curadora independente Estrella de Diego, nascida em arquivo pictórico do cotidiano e do imaginário de seu povo;
Madri. Estrella também faz parte da Real Academia de sobre as emergências culturais nas instituições e entre artis-
Bellas Artes de San Fernando, Espanha. O curador e tas, numa entrevista com o antropólogo argentino Néstor
diretor da Fundação Nabuco em Recife, Moacir dos Anjos, García Canclini; sobre o diálogo com sexodissidências
atual Coordenador-geral do Museu do Homem do Nor- em destaque na 35ª Bienal de São Paulo; na matéria de
deste. Foi curador da 29ª Bienal de São Paulo (2010) e capa, com Antonio Obá, que traz na poesia e brutalidade FOTOS: PATRICIA ROUSSEAUX
do pavilhão brasileiro na 54ª Bienal de Veneza (2011). A da sua obra a essência da memória contra a segregação
investigadora, professora e curadora do Palais de Glace, racial. Boa leitura e bom encontro! Esperamos por vocês
em Buenos Aires, Federica Baeza, doutora em História presencial ou virtualmente!