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BIENAIS ENTREVISTA
Em momentos duros assim, talvez a tendência seja ser mais Usar Instagram no processo curatorial é interessante, fale mais
documental, de denúncia do que ocorre. Mas essa bienal é o sobre esse processo...
oposto disso, ela é delicada e ambígua, o que talvez sejam Foram apenas dois artistas escolhidos pelo Instagram,
formas possíveis de resistência. mas obviamente usamos a internet para mais informa-
Em momentos assim, a primeira coisa é ouvir. Entre- ções, sites de galerias, site de instituições. Mas também
tanto, a oposição não é muito alta, o que se reflete usamos o formato de pesquisa tradicional, fomos para
nos trabalhos dos artistas turcos, que são mais a América do Sul, do Norte, África do Sul - onde fui pela
introspectivos, com mais pesquisa, mais poéticos, primeira vez e achei incrível, daria para fazer toda uma
o que não significa que sejam menos importantes. É bienal só com artistas de lá, é uma cena muito forte.
o caso do trabalho de Volkan Aslam, comissionado A curadoria de uma bienal é um processo no tempo, que um dia
para a Bienal, muito representativo do que muitas termina, já criar uma obra é um processo no espaço, que perma-
pessoas, especialmente as jovens, sentem, que é nece. Como vocês diferenciam estas duas tarefas?
o desejo de voltar à normalidade do dia-a-dia, ao Curar uma bienal é trabalho que nos consome muito,
enrolar um cigarro, beber um café, escrever uma de um momento para outro você se vê envolvido de
carta... situações políticas a conseguir patrocínio, definir logos,
Na mostra de fato há muitas obras que tratam da estabilidade espaços. É um monstro. E, nestes últimos seis meses,
e instabilidade do lar, como as pinturas de Andrea Joyce praticamente paramos de produzir nosso trabalho, tanto
Heimer, que representa lares enlouquecidos. que estou com medo de voltar ao ateliê (risos).
E nós não sabemos para onde isso vai, toda essa Creio que essa é a primeira vez que uma bienal está pronta quase
insegurança não está sendo sentida só aqui, mas em um mês antes da abertura, essa é a maneira escandinava de se
muitos lugares do mundo e ainda estamos pensando produzir uma bienal?
em como reagir a toda essa estupidez dos líderes Superneurótico, como os filmes do Bergman, você quer
políticos, dos altos escalões da política internacional. dizer (risos), com toda a culpa protestante... Bom, uma
Mas para isso precisamos tomar o nosso tempo, coisa que a gente traz como artista é essa experiência
insistir em nossas identidades, nossos modos de pragmática, afinal nós já participamos de muitas bie-
se expressar, sem sermos forçados, como artistas, nais, e sabemos que para colocar de 60 a 70 projetos
intelectuais e acadêmicos, a dar uma resposta rápida é preciso tempo. Tivemos um fantástico time também
como “hooligans” (torcedores fanáticos). e, talvez isso se relacione às dificuldades do momento,
E o artista brasileiro Victor Leguy, como você chegou ao houve uma energia positiva incrível em torno da bienal,
trabalho dele? de todos os técnicos, assistentes, voluntários, como se
Para ser honesto, eu vi o trabalho dele pela primeira todos quisessem que algo bom acontecesse.
vez no Instagram. (risos). Além dele, também desco- Como vocês começaram a fazer curadoria?
bri Andrea Joyce Heimer no Instagram, mas nunca Nós nunca sentimos de fato uma oposição entre práticas
a encontrei, apesar de nos comunicarmos muito. artísticas e curatorais. Quando começamos, no início
Com Victor, eu consegui ir visitá-lo em São Paulo e dos anos 90, em Copenhague, não havia uma cena
logo depois de conhecê-lo, percebi que realmente comercial e tão pouco uma cena institucional, então
gostaria de trabalhar com ele. É um artista com tudo era possível e tudo dependia de nós. Criamos
tantos níveis, que aborda questões sociais, usa nossas exposições, revistas, performances, espaços
readymades, o que é bastante raro. Esse trabalho expositivos, festivais.
que ele apresenta aqui, no qual mistura objetos que
encontra com histórias pessoais, é algo que muitos Mas é raro esse reconhecimento tanto como artistas como cura-
fazem, mas do jeito que ele trabalha, cobrindo partes dores. Essa é a primeira bienal, não é?
em branco, é uma excelente forma de apontar como Sim, e deve ser a última. (risos) Mas, sabe, foi natu-
a sociedade apaga partes significativas da cultura, ral, pensando novamente em Copenhague. Naquele
transforma tudo em quase a mesma coisa, é quase momento, era quase a única opção pensar em tudo como
uma forma escandinava de falar de monocultura. um “gesamtkunstwerk” (obra de arte total).
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Book_ARTE41.indb 18 11/29/2017 4:50:25 AM