Leandro Grass assumiu a presidência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
Leandro Grass. Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press

Leandro Grass, professor, sociólogo e mestre em desenvolvimento sustentável, gestor cultural e ativista ligado ao Partido Verde (PV) assumiu a presidência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no dia 10 de janeiro. Grass tinha integrado o Grupo de Transição do presidente Lula, coordenando o Grupo Técnico de Desenvolvimento Regional.
A missão de Grass é complexa: restaurar a capacidade da ação do Estado brasileiro na proteção do patrimônio histórico nacional, tarefa que foi vilipendiada de todas as maneiras possíveis no governo de Jair Bolsonaro durante os últimos quatro anos. Bolsonaro chegou a exonerar em 2020 a então presidente do Iphan, Kátia Bogéa, a pedido de um empresário aliado. Grass concedeu a seguinte entrevista à arte!brasileiros:

arte!✱ – Recentemente, o Iphan exonerou 18 superintendentes de quase todos os Estados do país. Essa mega-exoneração mostra que havia uma contaminação generalizada no patrimônio histórico, não?

Leandro Grass – A gente tinha um conjunto de superintendentes que não estava nem um pouco em sintonia com a formação técnica requerida, com os princípios de republicanismo do patrimônio, com referências muito desconectadas das políticas nacionais. Para você ter uma ideia, havia pessoas de perfil monarquista, ou seja, antirrepublicanas, assim como alheias totalmente ao setor, influenciadores digitais, além de outras ligadas a igrejas locais. Essas estavam lá por um arranjo político dessas igrejas. Estavam desconectados do corpo técnico e da formação relativa ao patrimônio. Essa primeira leva de exonerações foi para dar um primeiro ajuste substancial, trocar por técnicos, especialistas. Agora, haverá uma segunda leva da área de gestão. Trocamos praticamente todos os superintendentes, faltam apenas dois.

E de quais estados são esses dois?

Alagoas e Paraná.

Outro aspecto visível da deterioração do serviço federal do patrimônio foi a perda substancial de recursos. É possível dizer qual foi o tamanho da perda nos últimos quatro anos?

Em despesas discricionárias a perda foi de algo em torno de R$ 70 a 80 milhões nos últimos quatro anos. Na transição de governo, o novo governo recompôs os valores que eram praticados em 2016.

Quais serão as prioridades de investimento em sua gestão?

Há um conjunto grande de planos de ação que estão sendo preparados em cada estado, cada região, e essas ações definidas em seus próprios locais é que serão prioridade de destinação de recursos.

O senhor falou que o patrimônio recuperou o orçamento que tinha em 2016. Mas, desde aquela época, muita coisa nova foi incorporada, tombada, o Iphan cresceu bastante.

Sim, são mais de 1,2 mil bens tombados, fora os tombamentos imateriais. Estamos buscando parcerias junto à iniciativa privada, assim como nos municípios e estados, para aumentar os recursos, as ações. E, claro, também recompor nossa capacidade de execução orçamentária.

Houve alguns casos em que o antigo governo colocou à venda o patrimônio tombado, caso de alguns parques estaduais como Jericoacoara, no Ceará.

A gestão dos patrimônios naturais está a cargo do IMCBio, muito embora alguns sejam tombados, como é o caso do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Como bem tombado, a gente tem a responsabilidade de acompanhar. Boa parte desse patrimônio está a cargo de universidades, por exemplo, que definem o plano de uso e a forma de gestão. O que a gente teve de forma mais aguda foi descuido, paralisação de análises, abandono. Houve algumas tentativas de destombamento, mas que (o antigo governo) não chegou a concluir por conta da ação do Ministério Público.

Houve um caso, notório, de uma interferência direta do ex-presidente, no caso daquele empresário de Santa Catarina, o dono da Havan, Luciano Hang, que teve os planos de construção de uma sede barrados pelo Iphan, e ele conseguiu que fosse demitida a presidente do Instituto. Como dar publicidade ao que aconteceu nesses casos, durante esse período, para fins de conhecimento público?

Olha, a gente pediu relatórios situacionais para todas as superintendências. Processos que porventura tenham se chocado com as normativas internas, com a legislação e as normas, nós vamos encaminhar para a procuradoria, para que sejam tomadas as medidas adequadas de responsabilização.
No caso do patrimônio imaterial, o governo anterior chegou a nomear um pastor evangélico no setor justamente para atingir o conceito de imaterial.
A gente buscou sanar isso colocando um técnico da área no lugar. É sempre a melhor atitude: devolver aos especialistas a condução da área.

Um dos atos desse servidor foi tentar boicotar o acervo de arte de matriz africana que foi destinada ao Museu da República, no Rio. Como sua gestão está tratando desse assunto?

É a Coleção Nosso Sagrado. Nos próximos dias, nós vamos publicar uma portaria rebatizando essa coleção, que era chamada de Coleção de Magia Negra, rebatizando oficialmente como Acervo Nosso Sagrado.

Quando ocorreu sua nomeação para a presidência do Iphan, houve críticas. Muita gente dizia que o senhor estava preenchendo um cargo de indicação política.

É natural que, depois de todos os traumas por que passou o serviço do patrimônio histórico, os servidores quisessem para a presidência um quadro interno. Mas eu não sou alheio ao setor, tenho informação na área das políticas públicas, acompanho há muito tempo as questões relativas ao patrimônio. A gente já sanou isso. Indicamos uma diretoria formada por servidores, colocamos servidores de carreira em superintendências. A questão já foi 100% superada. ✱

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