Autoimperialismo, Benjamin Moser

Confira os destaques literários da Série Imperdíveis. Os títulos passam por ficção, filosofia, críticas e análise a aspectos autoritários do projeto de Brasília, a confusão simbólica e visual de São Paulo e a conquista predatória do Brasil pelos próprios brasileiros.

Por Vivian Mocellin

O Caso Meursault

Kamel Daoud, Tradução de Bernardo Ajzenberg, Biblioteca Azul, 168 páginas

História de O Estrangeiro contada de outro ponto de vista. Aqui, o árabe morto sem motivo por Mersault numa praia da Argélia colonial ganha carne, osso, identidade, nacionalidade, infância, sonhos e ambições, ao contrário da figura quase abstrata descrita por Camus em seu clássico.

TRECHO

“Depois de perder a mãe, esse homem, o assassino, deixa de ter um país e cai no ócio e no absurdo. É um Robinson que acredita poder mudar o destino matando o seu Sexta-Feira, mas que, ao se ver preso em uma ilha, se põe a discursar, com talento, feito um papagaio complacente consigo mesmo.”

AUTOR

O argelino Daoud, de 46 anos, ex-jornalista, ganhou o prêmio Goncourt com este seu primeiro romance, que teve os direitos vendidos para mais de 20 países.


Autoimperialismo

Benjamin Moser, Tradução de Eduardo Heck de Sá, Planeta, 128 páginas

Em três ensaios – Cemitério da Esperança, A Pornografia dos Bandeirantes Autoimperialismo -, o autor se dedica a criticar os aspectos autoritários do projeto de Brasília, a confusão simbólica e visual de São Paulo e a conquista predatória do Brasil pelos próprios brasileiros.

TRECHO

O que comove na arquitetura monumental é a forma desajeitada como ela trai seus próprios propósitos. Enquanto procura transpirar permanência, já se encontra em decadência. Na tentativa de se mostrar majestosa, revela sua vaidade (…)”

AUTOR Publicou Clarice, biografia de Clarice Lispector, e traduziu e editou obras da escritora, tornando-a mais conhecida e admirada nos EUA e Grã-Bretanha. No momento prepara biografia de Susan Sontag.

 

Velázquez

José Ortega y Gasset, Tradução e organização de Célia Euvaldo, WMF Martins Fontes, 216 páginas

Reunião dos principais ensaios do filósofo sobre o pintor Velázquez (1599-1660), parte deles tirada de Papeles sobre Velázquez y Goya (1950). Há também a transcrição de uma aula ministrada em 1947, além de reproduções de alguns quadros, como Las Meninas e o retrato de Inocêncio X.

TRECHO 

“Até Velázquez, a pintura queria fugir do temporal e simular na tela um mundo alheio e imune ao tempo, fauna de eternidade. Nosso pintor tenta o contrário: pinta o próprio tempo, que é o instante, que é o ser enquanto condenado a deixar de ser, a transcorrer-se a corromper-se.”

AUTOR

O espanhol Ortega y Gasset (1883-1955) foi um dos grandes pensadores do século XX. Filósofo, foi também educador, político e editor.


O Direito à Preguiça

Paul Lafargue, Tradução, apresentação e notas de Alain François, Edipro, 96 páginas

Escrito na prisão e publicado em 1855, esse manifesto bastante irreverente, mas não menos procedente, exalta a importância do ócio e do prazer em contraposição à febre do trabalho, “contraída” depois da Revolução Industrial e disseminada pelos donos do capital.

TRECHO

 “(…) quando Villermé visitou a Alsácia, o minotauro moderno, a oficina capitalista, já havia conquistado a região; na sua bulimia de trabalho humano tinha arrancado os operários de seus lares para melhor espremê-los e extrair o trabalho que continham.”

AUTOR

Casado com Laura, filha de Marx, Lafargue (1845-1911) foi um importante difusor das ideias do sogro e também um militante socialista de peso, tendo fundado o pioneiro Partido Operário.


O Conto Zero e Outras Histórias

Sérgio Sant’Anna, Companhia das Letras, 174 páginas

Todo novo livro de contos de Sérgio Sant’Anna é algo a celebrar, e aqui ele não decepciona. Trabalho mais pessoal, combina memória e ficção para tratar do amor, da solidão, do ofício de escrever e também de momentos singulares, como o primeiro cigarro ou a residência artística nos EUA.

TRECHO

 “Não seria propriamente um conto, ficaria dias e mais dias rondando a sua cabeça, você não escrevia uma única frase, uma palavra que fosse, pois ela o comprometeria com um seguimento, um desfecho, e o que você queria era uma prosa solta, que não precisasse ser escrita e concluída”

AUTOR

 Um dos grandes da literatura contemporânea brasileira, recebeu quatro vezes o prêmio Jabuti e outros prêmios, e teve textos adaptados para o cinema.

Os Farsantes

Graham Greene, Tradução de Ana Maria Capovilla, Biblioteca Azul, 360 páginas

Décimo romance do autor britânico, relata, numa combinação de fatos reais e ficção, o encontro de personagens conflitantes no Haiti do tirano Papa Doc. O narrador é dono de um hotel decadente. Belas mulheres, vigaristas, idealistas e os sangrentos tonton macoutes completam o elenco.

TRECHO

“Tinha cortado os pulsos e depois a garganta, para ter certeza. (…) Não devia estar morto havia mais que alguns minutos. Meus primeiros pensamentos foram egoístas: eu não poderia ser culpado por um homem se matar em minha piscina.”

AUTOR

 Greene (1904-1991) dividia seus romances entre “sérios” e “de entretenimento”. Os Farsantes, assim como O Americano Tranquilo (lançado pela mesma editora), está no primeiro caso.

Censores em Ação

Robert Darnton, Tradução de Rubens Figueiredo, Companhia das Letras, 376 páginas

Estudo sobre a censura, dividido em três casos: a França dos Bourbon, a Índia durante a ocupação inglesa e a Alemanha Oriental comunista. Em comum, a erudição dos censores e o controle do Estado sobre a produção intelectual e a expressão literária em particular.

TRECHO

“Levei certo tempo para formar uma imagem clara da organização da burocracia (…) A ficção na Alemanha Oriental era a porta número 215, quarenta porta adiante, 
seguindo por um corredor mostarda que parecia não ter fim enquanto fazia curvas e contornava um pátio.”

AUTOR

 Professor e diretor da biblioteca em Harvard, Darnton é autor de O Grande Massacre dos GatosO Beijo de Lamourette e, entre outros, O Diabo na Água Benta.

Conversando com Varejeiras Azuis

Edward Lear, Tradução de Dirce Waltrick do Amarante, Iluminuras, 128 páginas

Quatro crianças viajam pelo mundo num barco com uma gatinha, o estranho Manha-Artimanha e uma enorme chaleira, que serve de cozinha e dormitório. Receitas absurdas, plantas inimagináveis, um poema indiano e uma série de limericks completam esse livro nada “escruvioso”.

TRECHO

“Durante o dia, Violeta se ocupava, sobretudo, em colocar água salgada num latão; enquanto seus três irmãos a mexiam violentamente, na esperança de que 
ela se transformasse em manteiga, o que raramente, se não nunca, acontecia.”

AUTOR Precursor de Lewis Carroll na literatura nonsense, Lear (1812-1888) começou como desenhista e pintor. Viajou muito por conta de doenças respiratórias e produziu vários livros de poemas curtos e de viagens.

 

 

 

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